O livro retrata histórias, encantos e lutas do povo Pataxó de Cumuruxatiba
No mês de abril, em que se comemora o Dia do Índio, estudantes e professores do Anexo Kaí do Colégio Indígena Kijetxawê Zabelê lançam livro para lembrar que é preciso ensinar e divulgar as histórias de resistência dos povos indígenas todos os dias. O Livro Kijetxawê Zabelê: Aldeia Kaí foi construído por estudantes e professores Pataxó, com mediação de educadores e artistas envolvidos no Projeto. Será lançado na Aldeia Kaí, em Cumuruxatiba, distrito de Prado, no Extremo Sul da Bahia, dia 13 de abril. O lançamento faz parte de um seminário itinerante organizado pelas professoras Laura Castro (UFBA) e Cinara Araujo (UFSB), que percorrerá entre os dias 12 e 16 de abril o campus Salvador, na UFBA, e todos os campi da Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), onde o projeto foi gestado.
O livro ?? que está disponível para download gratuito – será lançado em todos os dias da programação. A publicação é destinada a escolas indígenas e não indígenas de todo o país, com a intenção de fortalecer a comunidade escolar da Zabelê da Aldeia Kaí e a história dos Pataxó de Cumuruxatiba. A reflexão guia do Seminário Itinerante é pensar no livro no contexto escolar indígena, principalmente a partir da participação dos estudantes indígenas, assim como pensar a presença dos indígenas nos livros das escolas não-indígenas. A ideia é reunir mesas com os artistas envolvidos no projeto, como Tamykuã Pataxó (Talita Oliveira), fotógrafa que participou de todas as ações, assim como estudantes indígenas das universidades e demais pesquisadores envolvidos.
O livro – Composto por três partes: narrativas de resistência e retomada da comunidade Pataxó da Aldeia Kaí; atividades que podem ser realizadas em sala de aula e uma história infantil criada a partir de oficinas e conversas na escola, o livro está disponível na versão impressa e digital (www.edicoeszabele.com.br). Nele, é possível agarrar-se à cauda da ??cobra do tempo? e caminhar pelo percurso de luta e resistência do povo indígena da região. Ou se deixar seduzir pelas histórias dos encantados, delicadamente construídas e desenhada pelas crianças da aldeia. No livro das ervas, o convite é para adentrar nos saberes indígenas de cura por meio das folhas sagradas.
A todo momento, o/a leitor/a será interpelado por poesia, desenhos, manifestos, canções que retratam a força e potência desta comunidade indígena. O livro permite também um encontro com as gigantes Pataxó, mulheres como Dona Jovita (pajé da Aldeia Kaí), que com seus cantos de guerra, sabedorias e muito trabalho lutam dia e noite pelo direito à terra, a vida e à dignidade do povo Pataxó da região.
Oficinas – Como o objetivo do livro também é estimular o desenvolvimento de atividades pedagógicas nas escolas indígenas e não indígenas, várias páginas são feitas para serem recortadas, coladas e transformadas em jogos. Dicas de atividades se espalham pela publicação e inspiram educadores/as a tratar importantes temas de forma lúdica e criativa. Para estimular o uso do livro e das atividades propostas, a equipe do projeto se coloca à disposição para ir gratuitamente em escolas e outros espaços educativos para realizar aOficina Vivência do Livro no Contexto Escolar Para solicitar, basta enviar um e-mail para professoralauracastro@gmail.com.
ATX?HU – Integra o livro, o ATX?HU que significa ??linguajar?, em patxôhã. Elaborado em junho de 2018, a partir de um encontro de saberes com a artista indígena Rita Pataxó e as oficinas que integraram a residência artística do Coletivo Sociedade da Prensa, o ATX?HU traz o alfabeto patxôhã construído a partir de grafismos e carimbos. Com apoio do estudante da Universidade Federal do Sul da Bahia, Vitor Fabem, o alfabeto foi transformado em fonte de computador que pode ser baixada gratuitamente no site do projeto (www.edicoeszabele.com.br). ?Impressos nesse alfabeto estão as memórias e os afetos gerados por esse encontro. Dessas letras se desdobram palavras de resistência e narrativas?, destacam Laura Castro e Cacá Fonseca, organizadoras da publicação que tem autoria coletiva.
Como tudo começou ?? Entre 2015 e 2016 a Aldeia Kaí foi vítima de uma série de violências. Em janeiro de 2016, a aldeia sofreu uma violenta e humilhante reintegração de posse que destruiu todas as ocas, casas, plantações e um posto de saúde. Cerca de 100 policiais federais e militares invadiram a área, expulsando a comunidade do seu território, cumprindo o mandado de posse favorável à suposta proprietária da terra, outorgado no ano de 2015. Apenas a escola Zabelê na Aldeia Kaí havia sobrevivido aos tratores e serviu de cozinha, quarto, habitação para muitos.
Foi diante deste contexto de dor que se deu o encontro da escritora e professora universitária Laura Castro com a aldeia. No âmbito de um projeto de extensão da Universidade Federal do Sul da Bahia, onde ensinava, Laura e uma equipe de estudantes bolsistas começaram a desenvolver oficinas e outras atividades na aldeia Kaí. O desejo de construir o livro, levou Laura a juntamente com o Coletivo Sociedade da Prensa da qual faz parte a escrever o projeto Edições Zabelê que foi contemplado por um edital do Fundo de Cultural do Estado da Bahia (Funceb).
??A reintegração de posse de 2016 foi muito sofrida, a destruição da aldeia foi assistida pelas crianças e é uma história traumática para os Pataxó da Aldeia Kaí. Tentando responder um pouco da pergunta ??O que pode um livro??, a partir da experiência que vivi com as crianças, fiquei me perguntando se talvez a criação desses encantados, deste livro vivo e a reconexão poética com essas histórias poderiam contribuir para a cicatrização dessa ferida?, partilhou Laura.
As Edições Zabelê surgiram, assim, como uma possibilidade de conviver com os Pataxó de Cumuruxatiba, especificamente da Aldeia Kaí, a partir de sua escola. Foram realizadas uma série de oficinas que contemplam as etapas de criação de um livro para as turmas do Ensino Infantil, Fundamental, Médio e EJA. Foram oficinas de escrita poética, desenho, serigrafia, encadernação e criação de carimbos. Os artistas residentes puderam também, partilhar como aprendizes de valiosos momentos de troca de saberes e fazeres pataxó como as pinturas corporais com jenipapo e a feitura do bolo de puba. Além de acompanhar, de perto, as inúmeras dificuldades enfrentadas por toda a comunidade escolar com as recorrentes faltas de transporte e merenda escolar.
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