
Os últimos dias trouxeram uma série de boas notícias na economia brasileira: queda do desemprego, inflação menor que a esperada, projeção de crescimento maior do PIB, confiança em alta na indústria, no comércio e nos serviços. Os principais motivos para os dados positivos são: a volta do consumo, devido à reabertura após o arrefecimento da pandemia, a valorização do preço das commodities exportadas pelo Brasil, e os estímulos concedidos pelo governo, como o adiantamento do 13º, a possibilidade de saque extraordinário do FGTS e o aumento no valor do programa assistencial Auxílio Brasil em comparação com o seu predecessor, o Bolsa-Família. Esses estímulos fazem a economia andar e os consumidores voltam a comprar.
O principal resultado positivo foi a queda do desemprego: o índice recuou para 9,8% da população economicamente ativa, a menor taxa para um fim de trimestre desde 2015, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A expectativa de crescimento do PIB brasileiro para 2022 subiu. O Instituto de Economia e Pesquisa Aplicada (Ipea) prevê agora alta de 1,8%, ante 1,1% em março. Segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), a confiança dos empresários também cresceu: no setor de serviços, a alta foi de 0,4 ponto em junho, em relação a maio, para um total de 98,7 pontos. Já na indústria o aumento foi de 1,5 ponto, para 101,2 pontos. No comércio, a elevação foi de 4,6 pontos. Outro indicador da indústria, medido pela agência de análises financeiras S&P Global, mostra que a demanda doméstica tem sido a principal responsável por impulsionar o setor. O PMI (Índice de Gerentes de Compras, na sigla em inglês) marcou 54,1 pontos em junho ??? acima de 50 indica crescimento. Na última semana, também foi divulgada a ???inflação do aluguel???, que veio abaixo do esperado por analistas de mercado. O IGP-M, usado para reajustar contratos no setor imobiliário, acumula alta de 12,70% nos últimos 12 meses até junho, bem abaixo dos 35,75% acumulados até junho de 2021.
???Vivemos num cenário em que tudo muda num curto espaço de tempo. Esses indicadores são o cenário conjuntural de janeiro a maio. Vem das exportações de commodities com preço alto, por causa da guerra na Ucrânia, e da mobilidade ter aumentado e a população ter saído nas ruas no pós pandemia, consumindo serviços. ?? uma movimentação importante do lado real da economia, principalmente para os serviços, além dos pacotes de ajuda do governo, FGTS e o Auxílio Brasil, do qual ainda não há uma análise do quanto ajudou no resultado econômico, mas ajudou???, analisa Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi).
Cautela no segundo semestre
O momento econômico, porém, ainda desperta cautela. O Banco Central admitiu que a inflação fechará 2022 em 8,8% ??? acima do teto da meta, que é de 5%. Por esse motivo, tem subido a taxa de juros Selic, para tentar forçar uma queda dos preços e garantir que as metas de 2023 e 2024 sejam cumpridas. Em maio, o índice de inflação oficial, o IPCA, subiu 0,47%, uma desaceleração em relação a abril, mas o acumulado de 12 meses continuava em dois dígitos, com 11,73%, de acordo com o IBGE. A inflação tem registrado picos tanto pelo reaquecimento da economia após o arrefecimento da pandemia quanto por outros fatores, principalmente externos: a guerra na Ucrânia fez subir os preços de commodities, como petróleo, gás natural e trigo. O petróleo, principalmente, tem bastante importância na economia brasileira, devido ao modal rodoviário ser o mais utilizado para transporte de cargas ??? assim, as altas contaminam outros setores. Também houve problemas em cadeias de suprimentos globais, outro efeito da pandemia, agravados após lockdowns na China que paralisaram os portos do país. Assim, o aumento da inflação é um fenômeno presente em boa parte dos países, incluindo europeus e os Estados Unidos.
Para conter o fenômeno, a autoridade monetária brasileira começou a subir os juros ainda em março de 2021, antes da maioria das outras nações. Atualmente, a taxa está em 13,25% ao ano. O efeito é o de desacelerar a economia, mas só começa a ser sentido após vários meses. Devido a todas essas pressões externas, é esperado que a atividade econômica desacelere no Brasil no segundo semestre, impedindo um crescimento maior do PIB ??? após a alta de 1% registrada no primeiro trimestre e a que é esperada no segundo trimestre (a divulgação está marcada para ocorrer no início de setembro).
Outra preocupação é a possibilidade de uma recessão a nível global. Os bancos centrais de outros países, assim como o brasileiro, têm subido os juros para combater a inflação, e a consequência é reduzir investimentos e limitar o crescimento. O Brasil, como um país produtor de commodities, seria afetado. ???O momento é delicado para o mercado, que começa a desacelerar e a jogar a perspectiva de crescimento para baixo. O mundo se assusta e deve sair totalmente de uma época de juros negativos e baixa inflação, para outra, de juros altos e inflação alta. O mundo desacelerando consome menos commodities, e o Brasil, como grande produtor desses gêneros, deve sofrer com isso???, explica Piter Carvalho, economista da Valor Investimentos. No entanto, ainda não é consenso que a recessão de fato irá se concretizar.
Outros fatores a serem considerados em uma projeção para a inflação no Brasil são o risco político, já que o país passará por eleições em outubro, e o risco fiscal. ???Temos nossas particularidades porque é ano eleitoral. ?? natural que os governos busquem favorecer a visibilidade e a performance deles, então, é um período específico, que tem estímulos específicos???, comenta Tingas. O Senado aprovou na quinta-feira, 30, a chamada ???PEC das Bondades???, que amplia uma série de benefícios sociais ??? por exemplo, eleva o Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 ??? e tem custo estimado em R$ 41,5 bilhões, fora do teto de gastos que limita as despesas do governo à inflação do ano anterior. O texto ainda precisa ser apreciado pela Câmara, mas o mercado tem reagido mal, devido ao temor fiscal sobre as contas do governo brasileiro e à capacidade de a União honrar seus compromissos financeiros.
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