Tiago D. Oliveira: leitor tardio e reconhecimento precoce

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O escritor baiano Tiago D. Oliveira, 38 anos, já conseguiu uma façanha que poucos colegas de profissão conseguiram: em 2020, foi um dos finalistas do importante Prêmio Oceanos, que aponta os melhores livros da língua portuguesa que foram lançados em qualquer país lusófono num determinado ano. Nada mal para quem estava apenas em seu quarto livro, cinco anos após a estreia como autor. Tiago concorria pelo livro de poemas As Solas dos Pés de Meu Avô.

Era uma conquista e tanto para quem, até os 20 anos de idade, lia apenas por obrigação escolar. O primeiro livro que leu por iniciativa própria foi uma coletânea de Carlos Drummond de Andrade, que ganhara de presente de Manuela, hoje sua esposa.

Agora, Tiago é um dos premiados do Selo João Ubaldo Ribeiro, que financia a publicação de autores locais. O escritor lança nesta sexta-feira seu novo livro, Soprando o Vento, contemplado na categoria poesia pelo edital que leva o nome de um dos maiores escritores brasileiros. Os textos já estavam praticamente prontos quando ele soube da premiação e decidiu inscrever-se.

“Escrevo diariamente, quase como uma terapia, então o livro estava organizadinho, já havia terminado os poemas”, observa o autor. Segundo Tiago, “soprar o vento” é uma alegoria que simboliza a resistência, uma marca presente nestes textos.

“A resistência é marca do livro, mas não só a resistência política. ?? uma marca explícita em alguns momentos e, em outros, ela é pincelada com delicadeza e sensibilidade”.

Ainda antes de ser arrebatado pela literatura, a música era a paixão de Tiago. “Sou da perfieria, onde a música e a oralidade são muito presentes. Nasci e fui criado no bairro Sete de Abril [em Salvador], que tinha um ar bucólico, era uma grande fazenda”, lembra-se.

Até ali, o Tiago só tinha contato com os livros na escola. E a música é que lhe dava imaginação e criatividade, como os livros são para algumas crianças. “Metade do ano, ouvia Roberto Carlos e na outra, forró. A potência do Nordeste despertava uma narrativa em mim e ficava uma riqueza imagética que me dessas canções, que me remetiam à casa de minha avó, no interior”. Além de ouvinte, Tiago era guitarrista de uma banda de rock que tinha com amigos.

A literatura só entrou para a vida dele mais intensamente quando foi morar em Portugal, depois de ter estudado um pouco de engenharia e administração no Brasil, sem ter concluído. Lá, foi estudar jornalismo. Depois, transferiu-se para o curso de letras e concluiu o curso mais tarde, na Ufba. Uma conversa com Manuela, que era sua namorada, foi decisiva:

“Ela me perguntou: Você nunca parou pra pensar que o professor é também o centro das atenções, no ‘palco’?”.

Foi aí que ele começou a levar a sério a ideia de ensinar. Hoje, é professor de língua portuguesa de uma escola particular em Lauro de Freitas, depois de ter passado pela rede pública. Mas, mesmo tendo deixado de ensinar nessas escolas, ele faz questão de visitá-las de vez em quando e apresentar seus livros aos estudantes. “Eles ficam encantados. Vou a bairros como Cajazeiras e Sete de Abril e vejo o brilho no olho delas. Dizem: ‘ah, você morou aqui, você é escritor… se você pode, eu também posso”.

Para o público estudantil, Tiago lançou recentemente Para Além de 22 (Ed. Caramurê), que conta, em forma de poema, o que foi a Semana de Arte Moderna de 1922 e o legado que o evento deixou para a cultura brasileira.

“A Semana durou, na verdade, só três dias, por falta de dinheiro. E cada capítulo é dedicado a um dia. O leitor fica sabendo a importância da Semana, quem a financiou, os bastidores. De uma maneira divertida, sabe até por que Villa Lobos foi vaiado ao entrar descalço no palco”.

capa alem 22

Livros do Selo João Ubaldo serão lançados queinta-feira (28)

Os livros da coleção Selo João Ubaldo Ribeiro ??? Ano III serão lançados nesta sexta-feira. O edital é promovido pela Fundação Gregório de Mattos (FGM) e as primeiras publicações foram lançadas em 2016.

Desta vez, foram premiados Daiana Oliveira (categoria crônica/livro: Fuxico, Resenha, Mexerico nas Esquinas e Buzus de Salvador); Breno Fernandes (romance/As Fotos Roubadas); Aícha Pinheiro (drama/Alimentando as Feras); Tiago D. Oliveira (poesia/Soprando o Vento); Paulo Atto (drama/A Travessia do Grão Profundo); Stael Mamed (literatura infantil/História do Bicho-Folhagem); Márcia Monteiro (livre/Efemérides) e Aruane Garzedin (conto/Sobre Quatro Patas Há um Lugar Seguro).

Hoje, às 17h, haverá uma roda de conversas com Breno Fernandes, Márcia Fonseca, Tiago D. Oliveira e Aruane Garzedin. O evento será transmitido ao vivo no canal da FGM no Youtube.

Amanhã, às 17h, os livros serão lançados no Teatro Gregório de Mattos, com a presença dos autores, além de convidados e da imprensa. A presença é restrita a esse grupo por causa da pandemia de covid-19.

???O Selo João Ubaldo Ribeiro já está consolidado no campo literário de Salvador. Autores consagrados e novos autores lançam lado a lado suas obras. ?? um intercâmbio de experiências fantástico. E o público pode esperar obras que exploram e constroem universos que encantam, provocam e emocionam???, declara Fernando Guerreiro, presidente da Fundação Gregório de Mattos.

Foto: Max Haack/divulgação

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