Tenham paciência antes de me dar um ‘zero’ por fuga ao tema, meus amigos. O artigo de hoje não é sobre Direito do Trabalho, mas alguns pontos dele serão postos aqui para entendermos sobre um interessante incentivo que a legislação estabelece em matéria tributária.
Além dos diversos encargos que se estabelecem por lei como obrigatórios para os empregadores, o sistema jurídico trabalhista é complementado por normas criadas em convenções e acordos coletivos que os sindicatos de empregados das diferentes categorias profissionais firmam com os representantes da respectiva coletividade de empregadores.
Muitas das convenções firmadas neste ambiente de negociação coletiva criam para os empregadores deveres novos, sem correspondência na lei. Um dentre os comumente criados é o de que o empregador forneça aos seus empregados um meio para a alimentação – a exemplo do que se vê, dentre outras, na Convenção 2022-2024 dos Comerciários de Salvador.
Este benefício normalmente é fruto da visão de que os empregados se oneram diante da necessidade de alimentação durante jornadas mais prolongadas. Assim, é compreensível que as normas coletivas geralmente o estipulem para jornadas de seis horas diárias ou mais e que a CLT, desde 2017, já considere o auxílio-alimentação como de natureza indenizatória (art. 457, § 2º).
Quando esta obrigatoriedade se estabelece, a situação do empregador não se limita imediatamente a absorver o ônus ou a elevar seus custos e seu preço. A legislação tributária assegura alguma participação do Estado no custeio deste tipo de benefício aos empregados e alivia o ônus dos empresários através do “PAT”, o Programa de Alimentação do Trabalhador.
O “PAT” é um programa de incentivos tributários criado pela Lei nº 6.321/1976 e, hoje, regulamentado pelo Decreto nº 10.854/2021, a fim de estimular a colaboração das empresas para a promoção do direito fundamental à alimentação e à segurança alimentar dos trabalhadores (art. 6º, caput, CF/88). Isto é, pelo PAT, o Estado se utiliza do instrumento de desoneração tributária para financiar indiretamente a promoção privada de um direito social de interesse público.
O modo de funcionamento deste programa é muito interessante e pode levar a alguma redução tributária, a depender da circunstância de cada empresa.
Como premissa, as empresas que desejem participar do programa precisam: (a) apurar o IRPJ/CSLL pelo regime do lucro real; e (b) requerer sua inscrição junto ao Ministério do Trabalho e Previdência.
Uma vez inscrita, a empresa deverá proporcionar a alimentação dos seus empregados diretamente pelo preparo ou distribuição de refeições ou indiretamente, pela contratação seja de fornecedores alimentícios, seja de facilitadores.
Por “facilitadores”, me refiro a empresas organizadas na forma de arranjo de pagamento que emitem moeda eletrônica para viabilizar os pagamentos em estabelecimentos comerciais (restaurantes e supermercados) credenciados. São os popularmente chamados de vale-refeição e vale-alimentação (cujas marcas foram vetadas pelo editor-chefe Rafael Barbosa Figueiredo, até virarem patrocinadoras da coluna. Rsrs!).
Ao assumir esta responsabilidade, a empresa não custeará sozinha esta alimentação.
De um lado, o programa admite a coparticipação do empregado em até 20% do custeio da alimentação. De outro, para cada centavo que a empresa efetivamente gastar na manutenção do PAT, a lei assegura que o dobro poderá ser deduzido do lucro tributável da pessoa jurídica na apuração do IRPJ de cada ano.
Nesta conta, são considerados matéria prima, mão de obra, salários e encargos, limpeza e até mesmo o gasto de energia elétrica relacionado ao preparo e à distribuição das refeições. Se a disponibilização se der por meio da contratação de terceiros, o valor pago pelo empregador será contabilizado para a dedução.
Em qualquer destes casos, a legislação admite que o cômputo dos gastos com a alimentação de todos os empregados ativos e até mesmo daqueles já dispensados, estes, limitados ao lapso de seis meses a contar da dispensa. A possibilidade de dedução se apura anualmente e pode chegar até o limite de 5% do total do lucro tributável de cada pessoa jurídica, autorizado ainda o transporte de eventual saldo credor não deduzido para utilização nos dois anos subsequentes ao da efetiva despesa.
Este regime se alinha, ainda, ao fato de a legislação garantir ao empregador que estas despesas não serão incluídas na base de cálculo de contribuições previdenciárias, nem de encargos trabalhistas quaisquer, nem mesmo o FGTS.
O Programa de Alimentação do Trabalhador oferece bons elementos para que as empresas reduzam a própria carga tributária do IRPJ, dando-lhes uma oportunidade cuja conveniência dependerá de certo equilíbrio financeiro entre as grandezas “lucro tributável”, “quantidade de funcionários” e “custo alimentar” que exigirá a aferição caso a caso.
Entretanto, aos que pretendem se beneficiar do programa, não só o alinhamento jurídico é recomendável, mas também o contábil. As normas que regem o PAT são duras para os casos de sua execução inadequada e resultam tanto na exclusão do programa quanto na aplicação de penalidades.
*Leandro Aragão Werneck é advogado, professor de Direito Tributário, doutorando e mestre em Direito pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), especialista em Direito Tributário (IBET) e conselheiro do Conselho Municipal de Tributos de Salvador (2021-2022).
Comentários Facebook