Com a incrível marca de 1 bilhão de streams nas plataformas digitais de música, o rapper carioca L7nnon, de 28 anos, é o artista mais ouvido do Brasil. Apenas no Spotify, ele conta 9,9 milhões de ouvintes por mês. No Instagram, são nove milhões de seguidores. Recentemente, o músico se apresentou no Rock in Rio, gravou com o inglês Tion Wayne e colaborou com Ivete Sangalo e Leo Santana nos populares feats (parcerias musicais).
L7nnon – lê-se Lennon – foi uma das atrações do Trapzada, ???o maior evento de trap do Norte/Nordeste???, segundo os organizadores, realizado no último sábado (24), em Salvador. Um público de 30 mil pessoas compareceu ao Wet, de acordo com a produção do festival, para assistir a shows, ainda, de Matuê, Teto, TZ da Coronel, Cabelinho, Delacruz e Welisson, alguns dos principais nomes do trap brasileiro da atualidade. Ou seja: o trap tá com tudo!
Mas, afinal, o que é o trap e no que se difere do rap? Pois bem: aos ouvidos menos treinados parece não haver muita diferença. No entanto, o trap é um subgênero do rap. Subgênero não no sentido de ser menor, menos importante, mas de ter suas raízes nessa que é a máxima expressão musical da cultura hip hop. O trap é mais dançante, pois utiliza, em sua produção, elementos como sintetizadores eletrônicos, onomatopeias, batidas bem marcadas, timbres graves e melódicos. Por aqui, pra ficar mais a nossa cara, a gente ainda insere um reggae, um funk, um pagodão, um piseiro, e o que ocorrer.
Ambos possuem letras com rimas que retratam, em sua maioria, a desigualdade social, violência, drogas, grana, sexo, racismo e toda a realidade que as comunidades marginalizadas enfrentam em qualquer parte do mundo. Mas, alto lá: no trap também há lugar pra positividade e reflexão sobre a necessidade da ocupação dos espaços por parte da juventude negra e sua ascensão social. A tradução literal ???trap??? significa ???armadilha???, gíria usada nos subúrbios de Atlanta, região sul dos EUA, onde tudo começou, no início dos anos 2000.
E nasceu na Bahia
No Brasil, o trap chegou depois, por volta de 2010. Sobre sua origem nacional, não existem informações precisas. Uns dizem que foi em Guarulhos (SP), outros em Vitória (ES). Mas tem quem garanta que o trap nasceu foi na Bahia, o que faz muito sentido. ???Acredito que o trap no Brasil surgiu na Bahia, com nomes como eu, Makonnen Tafari, La Bela Luna, que é uma artista de Feira de Santana, a primeira mulher no país a fazer um disco de trap. Não sei precisar uma data???, ressalta Vandal, rapper baiano que tem feito turnê pelo Brasil com a banda instrumental Bagum (com quem se apresenta no festival Radioca, em 13 de novembro) e a cantora Lívia Nery.
Ao que parece, esse meio é tipicamente masculino. Se você observar, entre as atrações do festival Trapzada nenhuma artista feminina foi escalada.
???Porque o cenário do trap, infelizmente, tem uma predominância masculina. Se você colocar no YouTube pra ver os artistas, quase não tem (nenhuma mulher)???, me diz um produtor do evento, ao ser questionado sobre as ausências.
Nome de destaque no trap baiano, Áurea Semiseria, 24, discorda: ???Mulheres como Cronista Do Morro, Preta Letrada e DelaRua (morta em 2020) são fundamentais. Se você não as conhece, é reflexo do machismo. A resistência das pessoas em ouvirem músicas feitas por mulheres é simplesmente por sermos mulheres, mas a nossa originalidade é explícita???, ressalta a cantora e compositora do bairro de Cajazeiras 11.
Destaques
???O interesse de artistas de outros gêneros pelo trap, com os feats, é um processo natural, tendo em vista a visibilidade e aceitação que ele vem tendo no contexto nacional, com shows e festivais lotados, grandes cifras rolando, artistas participando de campanhas, quebrando recordes, tendo expressivo número de visualizações. Atribuo a isso a aceitação por parte da massa e essa rodagem que o trap vem conseguindo ter, de assumir o papel de música urbana que gera muito dinheiro e faz com que o mercado se aqueça. Essa movimentação acaba construindo esse reverb em vários outros estilos???.
Vandal, cantor e compositor
@vandaldeverdade
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Vandal, cantor e compositor (Foto: João Victor Medeiros/ divulgação) |
???Sou uma artista de rap que transita entre seus subgêneros. Minhas letras são sobre a vivência como mulher, na minha realidade atual, que é de favela, e liberdade de corpos. Em 2018, lancei a faixa ???Autoestima em Versos???. Depois dela tenho ???Destemida???, ???Onze???, que são músicas muito importantes pra mim, e ???Tudududu???, que é a mais conhecida???.
Áurea Semiseria, 24, cantora e compositora
@carretadaonze
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Áurea Semiseria, cantora e compositora (Foto: Lorena Mendes/Divulgação) |
???Acredito que o trap baiano é diferenciado justamente por sua originalidade. Entre diversos grupos e artistas, eu consigo ver uma pluralidade genuína. Cada um fazendo sua arte, da sua forma, com elementos baianos, utilizando a essência do seu bairro, do seu conhecimento musical. Eu, por exemplo, faço um mix do trap com o reggae, que é minha linhagem musical. Eu venho da filosofia rastafari, utilizo essa minha essência dentro do meu estilo musical, que é o trap. Então, acho que dentro da Bahia temos essa diversidade, de forma latente???
Makonnen Tafari, 24, cantor e compositor
@makonnentafari
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Makonnen Tafari, cantor e compositor (Foto: Jean Jorge/Divulgação) |
???Sou do bairro de Cajazeiras e criei a página Trap Baiano em 2018, com o objetivo de fomentar, cada vez mais, a cena baiana e fazer história, já que outras páginas não dão espaço para a produção do nosso estado. Comecei a ouvir trap em 2016. Pra mim, ele é meu propósito e minha sobrevivência. Meus maiores ídolos são Vandal e Pivete Nobre, pois me sinto representado por eles, me vejo nas letras. Tem também Áurea Semiseria e Liz Kaweria???.
Alexandre Grant, 22, administrador da página Trap Baiano
@trapbaiano
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Alexandre Grant, da página Trap Baiano (Foto: Hick Duarte/Divulgação) |
???O trap é uma dessas manifestações negras dentro da cultura do hip hop, que conquistou destaque global. O fato dele ter surgido em Atlanta, nos Estados Unidos, ajuda na sua difusão, mas eu diria que a grande força do trap é sua capacidade de expressar anseios da juventude negra. Seu apelo para a dança junto com as letras que falam principalmente de desejos e ambições conectam o jovem negro e a jovem negra de Salvador, de Atlanta e de toda a diáspora???.
Marcelo Argôlo, jornalista e pesquisador musical
@marcelopargolo
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Marcelo Argôlo, jornalista e pesquisador musical (Foto: Lorena Vinturini/Divulgação) |
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