É falso que a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, tenha feito declarações sobre a aposentadoria de integrantes das Forças Armadas e militares, sugerindo a redução de benefícios. O autor dá a entender que a medida poderia ser adotada durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva, eleito presidente da República. Também é falsa a afirmação de que o estouro do teto de gastos, previsto para 2023 na gestão do petista, seja para bancar outros países. O recurso extra, se a medida for implantada, vai custear R$ 600 mensais para a população de baixa renda na volta do Bolsa Família.
Conteúdo investigado: Vídeo de três minutos no qual um homem alega que Gleisi Hoffmann, presidente nacional do Partido dos Trabalhadores, teria feito uma série de afirmações sobre a aposentadoria de integrantes das Forças Armadas e policiais militares. Segundo o autor, a parlamentar teria dito que a previdência desse grupo será incorporada ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), que haverá revisão da idade mínima para aposentadoria e a revogação da pensão por morte do cônjuge, e que militares e forças auxiliares não devem ter benefícios maiores do que o restante da sociedade.
Onde foi publicado: TikTok.
Conclusão do Comprova: É falso que a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidente do Partido dos Trabalhadores, tenha declarado que as aposentadorias de militares, policiais e servidores de forças auxiliares será de um salário mínimo e incorporada ao INSS, como afirma o autor de um vídeo que viralizou no TikTok. Sem citar fontes, o autor do conteúdo chama a atenção de militares que votaram em Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e afirma que Gleisi fez declarações sobre a aposentadoria desses profissionais. Nenhuma das declarações, contudo, foi encontrada em notícias na imprensa, nem em pronunciamentos do PT ou feitas pela própria parlamentar em suas redes sociais.
As supostas afirmações feitas por Gleisi, segundo o autor do vídeo, significam que o salário mínimo será o piso único para aposentadorias e pensões. Ele também disse, sem provas, que a parlamentar afirmou que os benefícios assistenciais e previdenciários serão unificados com o Benefício da Prestação Continuada (BPC), que haverá uma revisão na idade mínima para se aposentar, que as pensões por morte do cônjuge serão revogadas e que, segundo Lula, militares e afins “não devem ter benefícios maiores do que o restante da sociedade porque não são melhores” do que os demais cidadãos.
Desde 2019, Gleisi Hoffmann fez declarações sobre a reforma da Previdência, criticando o projeto. Ela chegou a afirmar que faltava coragem para mexer nas aposentadorias de juízes, promotores, militares e políticos, mas não fez, ao menos publicamente, nenhuma das declarações atribuídas a ela no vídeo. Em março de 2019, Gleisi defendeu que o governo federal estendesse as propostas da Previdência para militares ao restante da população – e não, como alegado no vídeo, de que os militares não deveriam ter benefícios maiores porque não seriam melhores do que ninguém na sociedade. Em julho daquele ano, ela votou a favor de uma proposta que previa que o benefício da aposentadoria para policiais e outros profissionais de segurança fosse equivalente ao último salário, com reajustes iguais aos profissionais da ativa, mas a proposta foi rejeitada.
No contexto atual, não há menções no plano de governo de Lula sobre militares, nem sobre aposentadoria para eles. Também não há qualquer proposta de redução de benefícios para qualquer categoria no documento apresentado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Não há declarações de Gleisi Hoffmann sobre o assunto e, de acordo com texto publicado em O Globo pela colunista Bela Megale, conselheiros de Lula têm defendido que o presidente eleito mantenha os benefícios concedidos aos militares pelo presidente Jair Bolsonaro (PL).
Também não é verdade que o PT pretenda “arrombar” o teto de gastos em mais R$ 200 bilhões, como afirma o autor do vídeo, para financiar ditaduras da América Latina. A PEC da Transição lista benefícios sociais como razão para extrapolar o limite do teto de gastos em 2023.
Falso, para o Comprova, é o conteúdo inventado ou que tenha sofrido edições para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma falsidade.
Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até o dia 11 de novembro, o vídeo teve 521.6 mil visualizações, 46.4 mil curtidas, 1.1 mil comentários e 6.1 mil compartilhamentos.
O que diz o responsável pela publicação: O Comprova entrou em contato com o autor do vídeo por meio de mensagem no Instagram. Ao responder se teria como comprovar as alegações sobre Gleisi Hoffmann, apenas disse que “não revela fontes”.
Como verificamos: O primeiro passo foi transcrever todas as afirmações feitas pelo autor do vídeo. Em seguida, fizemos diversas buscas no Google para descobrir se a deputada se posicionou ou fez alguma declaração sobre o tema. Assim, procuramos as palavras-chave “Gleisi” + “militares (ou Forças Armadas, ou aposentadoria)”, mas não encontramos nenhum conteúdo relacionado ao tema do vídeo investigado.
Ao buscar “Gleisi” + “INSS”, encontramos reportagens do UOL e da Gazeta do Povo sobre a situação dos militares no governo Lula e a reconstrução do sistema previdenciário estudada pelo PT, respectivamente.
A partir disso, procuramos por “Gleisi” + “reconstruir Previdência”, o que resultou em um material do site do PT e publicações no Facebook da deputada. Uma reportagem do jornal O Globo e outras do UOL e da Folha foram encontradas por meio de buscas como “PT” + “benefícios militares” e “Reforma previdência” + “militares”.
Por meio da busca avançada do Twitter, investigamos se Gleisi já postou conteúdos relacionados aos termos “aposentadoria”, “militares”, “INSS”, “previdência”, “BPC” [Benefício de Prestação Continuada], “salário mínimo” e “benefícios”. Encontramos apenas uma publicação de janeiro de 2019 sobre o salário mínimo.
Em relação ao governo de Lula, a pesquisa por “Lula” + “teto de gastos”, resultou em reportagens do Estadão, Folha, O Globo, Correio Braziliense e Congresso em Foco. Além disso, buscamos no Plano de Governo de Lula menções a militares e ao termo aposentadoria.
Por fim, fizemos contato com a assessoria de Gleisi e com o responsável pela publicação do vídeo no TikTok.
O que Gleisi já falou sobre aposentadoria de militares
O Comprova localizou algumas declarações da deputada Gleisi Hoffmann a respeito da aposentadoria de militares, a maior parte delas feitas em 2019, quando o Congresso caminhava para votar a proposta de Reforma da Previdência. Nenhuma delas, contudo, corresponde ao que aparece no vídeo.
Em janeiro de 2019, Gleisi compartilhou no Twitter uma reportagem do Valor Econômico sobre a estagnação do salário mínimo e criticou que faltava “valentia para mexer na aposentadoria de juízes, promotores, militares, políticos”. Em março daquele ano, ela criticou o projeto de reforma e um artigo que previa reduzir o valor do BPC de um salário mínimo para R$ 400. Também disse que o PT era contra o aumento da idade mínima para mulheres e os 40 anos de contribuição para se aposentar com integralidade. Ela disse estar aberta a “discutir a revisão dos privilégios dos grandes salários públicos, como juízes, promotores, procuradores, esse povo da Receita”. Sobre os militares, especificamente, Gleisi defendeu que o governo federal apresentasse as condições de aposentadoria para os militares e estendesse-as para o restante da população – e não o contrário, como sugere o autor do vídeo.
Não houve nenhuma menção, nem naquela época, nem depois, a incorporar a previdência dos militares e forças auxiliares ao INSS, de unificar o piso para aposentadorias e pensões em um salário mínimo, de revisar a idade mínima e revogar as pensões por morte do cônjuge, como afirma o autor do vídeo. Ao longo de 2022, Gleisi vem falando, sim, que o PT estuda “reconstruir o sistema previdenciário público” (Gazeta do Povo e Revista Fórum), mas não há menções diretas à situação dos militares.
Deputada votou a favor de benefício para policiais em 2019; proposta foi rejeitada
Em julho de 2019, Gleisi foi uma entre os 17 parlamentares que votaram a favor da criação de regras especiais de previdência para profissionais da área de segurança pública. A proposta foi rejeitada por 31 votos a 17, mas, se aprovada, ela beneficiaria policiais federais, policiais rodoviários federais, servidores da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), policiais legislativos, civis, militares e bombeiros, além de agentes penitenciários e socioeducativos, oficiais de justiça e guardas municipais.
A proposta sugeria, além de regras específicas para aposentadoria por idade, tempo de contribuição e de atividade no cargo, que o benefício de aposentadoria para esses profissionais fosse equivalente ao último salário, com reajustes iguais aos concedidos para os profissionais da ativa. O texto também tentava garantir um pedágio de 17% no tempo que faltava para a aposentadoria, mesmo percentual garantido aos profissionais das Forças Armadas, mas não passou. O pedágio significava que, quem estivesse perto de se aposentar, trabalharia 17% a mais do período que faltava para cumprir o tempo mínimo de contribuição.
Além de Gleisi Hoffmann, mais dois deputados do PT votaram a favor da proposta: Carlos Veras, de Pernambuco, e Jorge Solla, da Bahia. Foram parlamentares predominantemente de esquerda que votaram a favor dos policiais na ocasião, enquanto os representantes do governo Jair Bolsonaro, na ocasião, votaram contra os profissionais.
Plano de governo de Lula não prevê redução de benefícios
Embora as declarações sejam atribuídas falsamente a Gleisi Hoffmann, o conteúdo do vídeo sugere que as supostas medidas poderiam ser aplicadas no governo Lula, do mesmo partido da deputada federal. No entanto, o plano de governo registrado no site do TSE não faz qualquer menção ao termo “militares”.
Para a Previdência, os tópicos 16 e 17 na área de Desenvolvimento Social e Garantia de Direitos abordam o tema e, mais uma vez, não há tratamento específico para militares ou Forças Armadas. No texto, em resumo, está prevista a retomada da política de valorização do salário mínimo, de modo a recuperar o poder de compra dos trabalhadores e dos beneficiários de políticas previdenciárias. A proposta ainda estima a implementação de um modelo previdenciário que concilie o aumento da cobertura com financiamento sustentável.
“A proteção previdenciária voltará a ser um direito de todos e de todas. Frente aos milhares de trabalhadores e trabalhadoras hoje excluídos, o desenvolvimento econômico, a geração de empregos e a inclusão previdenciária serão centrais para a sustentabilidade financeira do regime geral de previdência social”, diz um trecho do plano de governo.
Já as Forças Armadas são citadas apenas no tópico 103, da área da Defesa da Democracia e Reconstrução do Estado e da Soberania. Exército, Marinha e Aeronáutica atuarão, segundo as propostas do governo Lula, “na defesa do território nacional, do espaço aéreo e do mar territorial, cumprindo estritamente o que está definido pela Constituição”.
Estouro do teto de gastos está previsto para bancar Bolsa Família
Diferentemente do sugerido no vídeo aqui investigado, a possibilidade de o governo Lula estourar o teto de gastos não é uma medida para assistir outros países, descritos na gravação como “ditaduras falidas do continente”. A proposta, se implantada, visa à manutenção do pagamento de R$ 600 mensais para a população de baixa renda, com o benefício que voltará a se chamar Bolsa Família.
Conforme reportagem do Estadão da última quarta-feira (9), a previsão é que Lula apresente uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para gastos extras em 2023 na ordem de R$ 175 bilhões. O texto ainda será elaborado e discutido com a equipe técnica do Congresso Nacional.
Essa iniciativa é uma alternativa à falta de recursos para o pagamento integral do benefício no Orçamento elaborado pelo governo Bolsonaro. Com a previsão orçamentária atual, segundo matéria de O Globo, o Bolsa Família seria reduzido de R$ 600 para R$ 400. Além disso, não haveria recursos para o complemento de R$ 150 por criança de zero a seis anos, prometido por Lula durante a campanha.
Por que investigamos: O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre pandemia, políticas públicas do governo federal e eleições presidenciais. Após um período eleitoral em que conteúdos de desinformação foram frequentes, materiais falsos e enganosos ainda circulam para desacreditar o sistema eleitoral, figuras políticas e as instituições brasileiras. Manifestações nesse sentido, com alegações infundadas, tentam tirar a credibilidade do processo e atingir a democracia.
Outras checagens sobre o tema: Em outras checagens envolvendo o PT, o Comprova já mostrou que vídeo de Barroso de 2021 é editado para dizer que ele é contra o partido e que postagens confundem documento de Encontro Nacional de Direitos Humanos do PT com plano de governo de Lula. Em relação à aposentadoria, o Comprova mostrou que é enganoso que Paulo Guedes anunciou redução em aposentadorias e outros benefícios do INSS e que edição de vídeo distorce declaração de Bolsonaro sobre ministério para Collor e confisco de aposentadoria.
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