Direito Médico pra Você: Canabidiol medicinal e desafios dos profissionais que defendem

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O desenvolvimento da ciência e da tecnologia vem possibilitando grandes descobertas no que se refere à saúde e dignidade humana.  Neste contexto de luta pela manutenção da vida, ganham destaque produtos que, embora eficazes no tratamento de doenças severas, por sua origem, encontram grande resistência para sua utilização, como é o caso do Canadibiol (“CBD”).

 

A Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde editou a Portaria nº 344, de 12 de maio de 1998, no intuito de aprovar um Regulamento Técnico que especificasse as substâncias e os medicamentos sujeitos a controle especial, listando-os conforme a Classificação Internacional de Drogas e classificando-os, segundo os efeitos produzidos no organismo humano. 

 

Neste contexto, a Cannabis Sativa L., popularmente conhecida como maconha, foi enumerada na “Lista E” da supracitada Portaria, que correspondia às plantas que poderiam gerar substâncias entorpecentes e/ou psicotrópicas, enquanto o THC constava na “Lista F2” como substância psicotrópica. Por outro lado, diferentemente do THC, o CBD (Canabidiol) não aparecia expressamente nas listas da ANVISA, somente sendo introduzido através da RDC nº 03, de 26 de janeiro de 2015, que atualizou a Portaria nº 344/1998 e o inseriu na “Lista C1”, a qual relaciona as substâncias sujeitas a controle especial.

 

Posteriormente, por meio da RDC nº 327/2019, a ANVISA dispôs sobre os procedimentos para a concessão da Autorização Sanitária para a fabricação e a importação, bem como estabeleceu requisitos para a comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e fiscalização de produtos de Cannabis para fins medicinais.  Tal Resolução fixou, em seu artigo 5º, a viabilidade de prescrição dos produtos de Cannabis sativa nas hipóteses em que esgotadas outras opções terapêuticas disponíveis no mercado brasileiro, estabelecendo, ainda, a necessidade da composição ser predominantemente de Canabidiol, regulando o teor de THC e possibilitando sua aplicação em índice superior a 0,2%, quando destinado a cuidados paliativos exclusivamente para pacientes sem outras alternativas terapêuticas e em situações clínicas irreversíveis ou terminais.

 

Surgiram os questionamentos e o preconceito com relação à prescrição do canabididol, por estar sempre atrelado à ideia de substância alucinógena ou psicotrópica, o que ocasionou em um grande retardo na autorização de importação pela ANVISA, em que pese já reunir condições de ter adequado a classificação do Canabidiol (CBD) há anos. 

 

Todavia, infelizmente essa demora de regulamentação pelo Estado custou a vida de alguns jovens, que morreram aguardando a medicação. Exemplo disso, foi publicado em maio de 2014, pelo jornal “O Globo”, que noticiou a morte de um estudante epilético, que ocorrera em razão da demora para a aprovação e importação do CBD, tendo sido registrada, ainda, a dificuldade financeira para a consolidação da aludida aquisição, em virtude dos seus autos custos, que, à época, atingiam o montante de US$ 450,00 a ampola nos Estados Unidos. 

 

Pois bem. 

 

Em um novo contexto, agora em 2022, com o uso do canabidiol muito mais aceito e regulamentado no país, embora ainda muito estigmatizado, surge uma nova discussão acerca da sua prescrição, dessa vez, devido ao fato do CFM, por meio da Resolução nº 2.324, ter restringido quase que totalmente a autonomia do médico para indicar tratamentos com a citada substância. 

 

Na Resolução, o CFM passou a autorizar o uso do canabidiol (CBD) apenas para o tratamento de epilepsias em crianças e adolescentes refratários às terapias convencionais na Síndrome de Dravet e Lennox-Gastaut e no Complexo de Esclerose Tuberosa. A diretriz manteve vedada a prescrição da cannabis in natura para uso medicinal, bem como quaisquer outros derivados que não o canabidiol. Segundo a norma, o grau de pureza da substância e sua forma de apresentação devem seguir as determinações da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

 

A norma aprovada pelo CFM vedava ao médico a prescrição de canabidiol para indicação terapêutica diversa da prevista na Resolução, salvo em estudos clínicos autorizados pelo Sistema formado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa e Conselhos de Ética em Pesquisa (CEP/CONEP). Também ficava proibido ao médico ministrar palestras e cursos sobre uso do canabidiol ou produtos derivados de cannabis fora do ambiente científico, bem como fazer sua divulgação publicitária, além de determinar a obrigatoriedade do termo de consentimento livre e esclarecido antes de iniciar o uso de tal medicamento.

 

Em outras palavras, para os demais tipos de epilepsia, a substância não poderia mais ser prescrita, além do fato de pessoas adultas e portadoras de doenças como depressão, ansiedade, dores crônicas, Alzheimer e Parkison, não estarem cobertos pela Resolução. 

 

Ocorre que, mais uma vez o direito à vida e à saúde entrou em pauta e dessa vez, saíram em defesa do medicamento, não só os usuários do CBD – que diga-se de passagem segundo dados da ANVISA hoje ultrapassa o número de 100 mil -, mas também os próprios médicos que acreditam na prescrição do canabidiol e puderam ver na prática excelentes resultados em seus pacientes. 

 

Assim, diante de toda polêmica envolvendo a citada resolução, e em atenção às solicitações para revisão da mesma pelas entidades médicas e sociedade civil em geral, o CFM, através da Resolução de nº 2.326/2022, decidiu por sustar temporariamente os efeitos da Resolução nº 2.324/2022, abrindo prazo para nova consulta pública acerca da prescrição do Canabidiol. Os interessados têm até 23 de dezembro de 2022 para apresentar sugestões por meio da plataforma eletrônica, as quais, tratadas sob os critérios de sigilo e anonimato, servirão de subsídio para novo posicionamento do CFM.

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