TST nega prescrição e decide por condenar família que manteve doméstica em condição análoga à escravidão por mais de 20 anos

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A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) manteve a condenação de uma família de São Paulo que, por mais de 20 anos, manteve uma empregada doméstica em condições consideradas análogas à escravidão. A decisão foi unânime, seguindo o voto da relatora, a ministra Liana Chaib.

 

Além de indenizações de R$ 350 mil por danos morais individuais e R$ 200 mil a título de indenização por dano moral coletivo, os patrões deverão pagar todos os direitos trabalhistas devidos desde 1998 – incluindo férias e 13º vencidos. Ao afastar a prescrição trabalhista, que restringe os pedidos aos cinco anos anteriores ao término do contrato, o colegiado ressaltou a imprescritibilidade do direito absoluto à não escravização.

 

A ação, ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) e pela Defensoria Pública da União (DPU), teve origem em denúncia repassada em junho de 2020 pelo então Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos de que, no endereço da família, uma trabalhadora idosa fora vítima de violência, maus tratos, tortura psíquica e exploração e estaria trancada no local, ferida. 

 

RESGATE E PRISÃO

O juízo da 53ª Vara do Trabalho de São Paulo autorizou a realização de diligência na casa e, na inspeção, o MPT e a equipe envolvida encontraram a trabalhadora “assustada e sozinha”. Foi apurado que ela vivia no local há três anos, sem receber salário regularmente. 

 

Os patrões haviam se mudado recentemente, e ela permaneceu num cômodo sem banheiro nos fundos da casa, sem as chaves do prédio principal. Conforme o MPT, desde o início da pandemia, ela havia sido proibida de entrar na casa, onde ficava o banheiro. 

 

A dona da casa foi presa em flagrante por abandono de incapaz e omissão de socorro e indiciada pelo crime de reduzir alguém à condição análoga à de escravo.

 

De acordo com os depoimentos colhidos, inclusive o da vítima, ela havia começado a trabalhar para a mãe da atual patroa em 1998, sem registro na carteira de trabalho. A partir de 2011, passou a morar com a família e a receber irregularmente, chegando a ficar meses sem salário. Em 2015, a família se mudou para a casa onde ela foi resgatada. Segundo seu relato, ela não recebia refeições e seu último salário fora de R$ 300.

 

Uma testemunha contou que, na única vez em que ela saiu de casa para passear com os cães no período da pandemia de covid-19, foi agredida pelo patrão. Os vizinhos também relataram que, recentemente, ela havia sofrido uma queda e passara a noite gritando, pedindo ajuda aos patrões, que não a socorreram.

 

Após ser resgatada, a idosa se recusou a ir para um abrigo estadual, por medo da covid-19 e porque não queria abandonar o cachorro da casa – “sua única referência afetiva e emocional”. Um vizinho então aceitou abrigar a mulher e o animal em sua casa. Segundo o MPT, ela não tinha nenhuma condição de subsistência, contando apenas com a caridade dos vizinhos.

 

Em sua defesa, os patrões sustentaram que, entre 1998 e 2011, a trabalhadora havia prestado serviços como diarista em várias residências e, em 2011, perdeu sua casa numa enchente. Por isso, eles teriam oferecido um lugar para ela morar, sem prestar nenhum serviço. Segundo eles, o cômodo que a idosa ocupava nos fundos da casa não era uma residência, mas um “local temporário” para ela guardar seus pertences até ter onde morar.

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