Justiça de Portugal põe em xeque investigação que derrubou governo de Costa

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(FOLHAPRESS) – Uma decisão do Tribunal da Relação (corte de segunda instância) de Lisboa pôs em xeque vários dos argumentos usados pelo Ministério Público de Portugal na investigação de corrupção que levou à queda do governo do agora ex-premiê António Costa, em novembro do ano passado.

Os desembargadores consideram que o MP não apresentou indícios concretos de tráfico de influência sobre decisões políticas do então primeiro-ministro. Costa pediu demissão na sequência do anúncio de que ele próprio, assim com outros nomes do primeiro escalão do Executivo, eram alvos de investigação.

A ação foi batizada de Operação Influencer justamente por ter como um dos pontos centrais um suposto esquema de tráfico de influência.

Em trecho da decisão a que o jornal Expresso teve acesso, a desembargadora Cristina Almeida e Sousa diz que não há indícios de interferência direta de um dos investigados, o consultor Diogo Lacerda Machado, apontado como melhor amigo do socialista.

A magistrada afirma que Ministério Público não fez algo essencial para a investigação: ter “descrito algum comportamento objetivo do primeiro-ministro passível de mostrar alguma receptividade ou predisposição para ouvir e acatar o que o seu melhor amigo teria para lhe dizer”.

As declarações foram feitas no julgamento de um recurso apresentado pelo MP, e não de processos e acusações em si, cujos inquéritos continuam em andamento. Mesmo assim, a decisão da corte, que não poupou críticas à atuação dos procuradores, inflamou o cenário político português.

“O Ministério Público deve explicações aos portugueses”, afirmou a deputada e ex-ministra socialista Ana Catarina Mendes. “Por que derrubou um governo e um Parlamento? Como se levantam suspeitas e se coloca em causa o bom nome das pessoas?”.

Ex-líder do PSD (Partido Social Democrata), legenda que chegou ao poder após as eleições legislativas antecipadas convocadas com a crise política, Rui Rio também criticou os procuradores. “Um tribunal superior a humilhar um Ministério Público, que, ao funcionar assim, envergonha o país e agride a democracia e a separação de Poderes”, escreveu o ex-deputado, que também já foi alvo de uma investigação da instituição.

A reviravolta jurídica deu ainda novo fôlego à possibilidade de que António Costa assuma o posto de presidente do Conselho Europeu, sucedendo o belga Charles Michel. Favorito de vários líderes do velho continente, o português tem como grande empecilho o imbróglio judicial.

Ao comentar a decisão do Tribunal da Relação, que desmonta a maioria das teses contra Costa, o presidente Marcelo Rebelo de Sousa, reconheceu que o socialista ficou agora mais próximo do braço da União Europeia. “Tenho a sensação de que começa a ser mais provável haver um português no Conselho Europeu, no próximo outono, em Bruxelas”, afirmou.

O Tribunal da Relação também derrubou as medidas de coação aplicadas a outros suspeitos formais da operação, incluindo Diogo Lacerda Machado, o melhor amigo de Costa, e Vítor Escária, então chefe de gabinete do premiê.

A corte, mais uma vez, negou os indícios apresentados pelos procuradores. Ainda em 2023, o juiz de instrução do caso, Nuno Costa, havia derrubado as prisões da dupla e de outros suspeitos. “Os fatos apurados não são, só por si, integradores de qualquer tipo criminal”, diz o texto da decisão.

“O tribunal chama a atenção para a incorreção de se tratarem assuntos de Estado à mesa de restaurantes, olvidando procedimentos e esquecendo a necessidade de se documentarem as relações havidas entre representantes de interesses particulares e os governantes no âmbito das suas funções”, prossegue.

O ex-primeiro-ministro António Costa ainda não comentou publicamente a decisão dos desembargadores.

Apesar de ter sido classificada como uma derrota do Ministério Público, a decisão não encerra o caso contra o ex-premiê, que permanece sob investigação. O inquérito, que estava no Supremo Tribunal de Justiça devido ao foro do cargo de chefe de governo, foi remetido há uma semana para a primeira instância. O DCIAP (Departamento Central de Investigação e Ação Penal) ainda não designou um responsável pelo caso de Costa.

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