Na terça-feira (30), a Polícia Federal optou por dar seguimento a um inquérito sobre a “máfia das creches” em São Paulo. O foco das investigações é investigar suspeitas de lavagem de dinheiro envolvendo o atual prefeito Ricardo Nunes (MDB) durante seu mandato como vereador da cidade.
Até o momento, a corporação concluiu parte da investigação, com mais de 100 pessoas indiciadas por desvios de verbas destinadas às escolas de educação infantil na capital paulista. O inquérito, que teve início em junho de 2019, teve um avanço significativo nesta terça-feira.
Em comunicado, Nunes refutou as acusações e afirmou que houve uma análise incorreta dos diversos documentos apresentados pela defesa dois meses antes das eleições. “O prefeito Ricardo Nunes não foi indiciado. No processo, não houve qualquer acusação contra ele ou a empresa Nikkey”, declarou.
O principal ponto da investigação gira em torno da suspeita de que organizações responsáveis pelas creches teriam recebido de volta parte do dinheiro que era declarado como despesas com materiais. As transações eram feitas por meio de cheques, depósitos e boletos, beneficiando indivíduos ligados à administração dessas organizações.
Uma fornecedora em particular, uma loja de materiais escolares, movimentou uma quantia de R$ 163 milhões.
Apesar de nenhum indiciamento até o momento, a PF apontou a necessidade de novas investigações em relação ao prefeito, um pré-candidato à reeleição, devido à suspeita de envolvimento em lavagem de dinheiro por meio de uma empresa de construção que também está sob investigação.
Além disso, a PF destacou que Nunes não apresentou as notas fiscais relacionadas aos serviços que ele alega terem origem nos depósitos em sua conta pessoal.
A investigação da PF levanta suspeitas sobre transações de uma empresa conhecida como a “noteira” do esquema das creches com Nunes, mencionando ainda relações dele com indivíduos ligados à Acria (Associação Amiga da Criança e do Adolescente), uma entidade que administra creches conveniadas com as quais Nunes tem proximidade.
Em 2021, a imprensa revelou que Nunes e uma empresa de sua família, a Nikkey Serviços S/S Ltda, receberam mais de R$ 30 mil em pagamentos da empresa Francisca Jacqueline Oliveira Braz em 2018. O prefeito sempre alegou se tratar de uma prestação de serviços.
Nesta terça-feira, a imprensa divulgou um vídeo onde uma investigada no caso, Rosângela Crepaldi, nega a prestação de serviços por Nunes e afirma ter participado da devolução desses valores a pessoas ligadas às ONGs.
“Foi repasse”, afirmou. “[Nunes] nunca prestou nenhum serviço”, completou, trecho obtido pela reportagem. A PF apontou que, ao longo da investigação, o prefeito não forneceu as notas fiscais correspondentes aos serviços que alega terem sido prestados.
De acordo com o relatório, Nunes “argumentou que na contabilidade da empresa Nikkey Serviços existem registros de entrada de valores e emissão de notas fiscais por serviços prestados, porém esse documento não foi encontrado”.
O relatório do órgão federal Coaf, conforme a PF, também revelou “movimentações atípicas”.
Há indícios de movimentações financeiras suspeitas nas contas do prefeito e em empresas vinculadas, consideradas incongruentes com a capacidade financeira do cliente.
O documento menciona a suspeita de que a situação poderia caracterizar lavagem de dinheiro.
Segundo o relatório obtido pela Folha, é fundamental dar continuidade às investigações relacionadas aos eventos envolvendo a Osc Acria e o então vereador Ricardo Luis Reis Nunes.
A Polícia Federal está investigando grandes repasses feitos pela Acria, uma entidade ligada a Nunes. Rosângela aborda o assunto em vídeos obtidos pela reportagem. “Toda a gestão da Acria era coordenada por essas pessoas [ligadas a Nunes], mas nós sabíamos que era ele [Nunes].”
O documento da PF menciona valores exatos, indicando que a Acria teria transferido R$ 2,5 milhões para a empresa Francisca Jacqueline, dos quais R$ 1,3 milhão foram devolvidos à entidade.
PREFEITO NEGA IRREGULARIDADE E APONTA ERRO DA PF
Em comunicado à reportagem, Nunes refuta a existência de irregularidades, afirma ter oferecido todas as informações necessárias e destaca que 111 pessoas foram indiciadas, mas o prefeito não foi um deles.
“No desfecho do inquérito e apenas por conta de uma interpretação equivocada dos inúmeros documentos apresentados pela defesa, o delegado sugere que os pagamentos feitos à empresa Nikkey por serviços prestados deveriam ter sido verificados, uma vez que as faturas foram contabilizadas e os impostos foram pagos.”
Nunes voltou a se manifestar sobre o vídeo de Rosângela Crepaldi, indicando que medidas criminais serão tomadas por difamação e outras violações penais. “É ultrajante e altamente suspeita essa manobra mesquinha às vésperas de uma eleição.”
Questionado pela reportagem, o advogado de Rosângela, William Albuquerque de Sousa Faria, esclarece em comunicado que o vídeo foi feito por razões de segurança e não tinha a intenção de ser divulgado. O vídeo obtido pela reportagem não está relacionado a um inquérito da Polícia Federal sobre o assunto. Nos registros, Rosângela optou por permanecer em silêncio.
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