A determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de convocar o proprietário do X, Elon Musk, marcou um novo episódio da disputa entre os dois e suscitou questionamentos sobre as ações do magistrado. Quase quinze dias após Musk anunciar o fechamento de escritórios no Brasil por descumprir as ordens de Moraes, o ministro enviou uma notificação, nesta quarta-feira, 28, ao bilionário, exigindo que ele designasse, em 24 horas, um representante da plataforma no país. Na noite de quinta-feira, 29, o X informou que não atendeu ao prazo estipulado pelo ministro e comunicou que aguardava o bloqueio de suas atividades.
Em outra frente, o ministro do Supremo determinou o bloqueio das contas da Starlink, empresa de internet via satélite de Musk. Moraes considerou a existência de um “grupo econômico de fato” comandado pelo empresário e ordenou o bloqueio de todos os valores financeiros para assegurar o pagamento das multas impostas pela Justiça brasileira ao X.
Musk reagiu chamando Moraes de “tirano” e “ditador”. Em um comunicado enviado aos clientes, a Starlink classificou a decisão do ministro como “inconstitucional” e afirmou que irá recorrer. O texto diz: “Esta ordem foi emitida em segredo e sem conceder à Starlink os adequados processos legais garantidos pela Constituição do Brasil”.
Enquanto alguns ministros do Supremo apoiam as decisões de Moraes para disciplinar plataformas que se recusam a obedecer ordens judiciais, como o X, juristas consultados pelo Estadão consideraram a forma como Moraes intimou Musk atípica e até mesmo ilegal. O ministro mandou a secretaria do STF notificar o empresário por meios eletrônicos. A conta oficial da Corte no X enviou a intimação através da própria rede social, em resposta ao perfil oficial da plataforma.
O advogado constitucionalista André Marsiglia considerou que a intimação, na maneira como foi realizada, é inválida. Segundo ele, Musk, sendo estrangeiro, deveria receber a notificação por meio de uma carta rogatória, e não por meios eletrônicos. Marsiglia afirmou que caso Moraes suspenda as atividades do X por falta de resposta de Musk, a medida será ilegal. “Esta intimação emitida pelo X é nula. É como se o X e o representante da empresa não tivessem recebido a intimação. Portanto, qualquer medida decorrente de uma intimação nula seria ilegal”, disse Marsiglia. O dono do X não tem mais advogados constituídos no país.
Morosidade
O professor Filipe Medon, da FGV Direito Rio, avaliou que a citação digital do X através das redes do Supremo é uma “situação sem precedentes”. Dessa forma, Moraes buscou contornar a lentidão dos mecanismos de cooperação jurídica internacional.
“Em linhas gerais, a intimação é válida”, afirmou o professor. No entanto, ele alertou que há dúvidas sobre quem deveria ser o destinatário da intimação e “como é possível comprovar o conhecimento inequívoco do recebimento”. O especialista em Direito Processual, Ludgero Liberato, observou que a intimação por meio de rede social não garante que o destinatário da ordem tenha recebido a notificação. “É essencial ter uma certeza absoluta de que a pessoa recebeu a intimação.”
STJ
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já abordou o tema, que é controverso. Em agosto, o.No decorrer do ano passado, em agosto de 2023, a Terceira Turma do STJ recusou um recurso de uma credora que desejava realizar a citação do devedor por meio de mensagem eletrônica em suas redes sociais, devido à complexidade de uma citação pessoal. Os ministros determinaram que a citação por aplicativos e redes não possui respaldo legal.
“A posição do STJ é contrária à utilização de notificações por aplicativos e redes sociais, porém a última decisão cabe ao Supremo, que tem o poder de alterar a orientação do STJ e dos demais tribunais, gerando uma grande insegurança jurídica”, afirmou o especialista em Direito Constitucional Thiago Pádua.
Em meio a conflitos, desde abril, Musk e Moraes têm trocado ataques públicos nas plataformas digitais. Enquanto o ministro insta X a cumprir decisões judiciais em investigações sobre a propagação de notícias falsas e ataques às instituições democráticas, o bilionário alega que Moraes viola os princípios da liberdade de expressão.
Essa disputa se junta a outras polêmicas envolvendo Moraes, que tem sido alvo de críticas pela centralização de poder na condução de inquéritos no STF, dos quais é relator, como os das fake news e milícias digitais. Musk foi incluído como investigado neste último inquérito por “dolosa instrumentalização” do X.
Recentemente, Moraes ordenou a abertura de uma investigação para apurar o vazamento de mensagens de seu gabinete – as conversas sugerem que ele solicitou, de maneira não oficial, relatórios sobre bolsonaristas ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O proprietário do X, Elon Musk, reagiu às decisões do ministro Alexandre de Moraes do STF, chamando-o de “tirano” e “ditador”. “Esse sujeito, Alexandre de Moraes, é um criminoso da pior espécie, se passando por juiz”, declarou o empresário em uma publicação. Musk também compartilhou uma montagem que retratava Moraes como um vilão da série de ficção científica Star Wars.
Além disso, Musk se referiu ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva como o “cachorrinho de colo” do ministro. Recentemente, Lula utilizou o X para divulgar seus perfis em outras redes sociais, como Instagram, Facebook e TikTok. Ao serem procurados, STF e Planalto optaram por não comentar.
A Starlink categorizou a decisão de Moraes como “inconstitucional” e afirmou que irá recorrer da mesma.
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