O Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, encaminhou ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) contra as conhecidas “emendas PIX”. Essas emendas foram acrescentadas à Constituição Federal pela Emenda Constitucional nº 105/2019.
O dispositivo permite a destinação de recursos federatis a estados, Distrito Federal e municípios por meio de emendas parlamentares impositivas ao projeto de lei orçamentária anual (PLOA), sob a forma de transferência especial, dispensando a necessidade de celebrar convênios para controlar a execução orçamentária. As emendas PIX também dispensam a indicação do programa, projeto ou atividade a serem beneficiados com os recursos alocados, além de retirar a competência do Tribunal de Contas da União (TCU) para fiscalizar os recursos federais.
Na visão de Gonet, esse sistema resulta na perda de transparência, publicidade e rastreabilidade dos recursos públicos federais, violando diversos princípios constitucionais, como o pacto federativo, a separação dos Poderes e os limites estabelecidos pela própria Constituição para alterar seu texto. Em uma solicitação cautelar, o Procurador-Geral solicita a imediata suspensão dos dispositivos que permitem as emendas PIX, até que o STF julgue o mérito da ação.
**Planejamento e Transparência**
Na ADI, Paulo Gonet destaca que a Constituição trata do orçamento no art. 165, definindo os normativos que compõem o planejamento orçamentário dos entes federativos: o plano plurianual (PPA), a lei de diretrizes orçamentárias (LDO) e a lei orçamentária anual (LOA). Segundo o texto constitucional, o orçamento é um instrumento de atuação transparente e responsável, que permite ao poder público executar despesas e investimentos de forma eficiente e planejada.
Os projetos de lei relacionados ao tema são de iniciativa exclusiva do presidente da República, o que evidencia o papel crucial atribuído ao Poder Executivo pela Constituição. Os parlamentares podem propor emendas e modificar o orçamento, desde que observem critérios de compatibilidade com PPA e LDO. Além disso, “a proposição, aprovação e execução dessas emendas devem seguir os princípios de transparência com máxima publicidade de informações”, argumenta Paulo Gonet.
A PGR argumenta que, ao permitirem a transferência direta e obrigatória de recursos federais a outros entes federativos, sem a necessidade de convênios para fiscalizar o uso dos valores ou indicar claramente sua destinação, as emendas PIX vão contra a lógica estabelecida na Constituição para a elaboração e execução do orçamento. Essa sistemática reduz o papel do Poder Executivo na operacionalização do orçamento e resulta na entrega dos recursos a outro ente federado de forma direta, sem chances de fiscalização do uso dos valores. “O montante simplesmente passa a ser do ente político beneficiado pela simples transferência”, afirma a ação.
O PGR destaca que, nesse sistema, a decisão sobre a distribuição do recurso é imposta pelo parlamentar autor da emenda, que nem sequer precisa indicar claramente.A finalidade e o uso dos valores são pontos cruciais quando se trata das emendas PIX. Essas emendas têm o poder de transferir valores federais diretamente a estados, ao Distrito Federal e municípios, o que acaba excluindo a competência do TCU para fiscalizar a aplicação desses recursos, que, em sua origem, são de natureza federal. Segundo a inicial, isso resulta em uma deturpação do sistema republicano de acompanhamento dos gastos públicos.
DADOS
Um relatório mencionado na ação, elaborado pela Associação Contas Abertas, Transparência Brasil e Transparência Internacional, aponta um significativo aumento nos valores destinados às emendas PIX. Em 2022, o montante atingiu R$ 3,32 bilhões, enquanto em 2023 esse valor dobrou, chegando a R$ 6,75 bilhões. O relatório destaca que um terço de todas as emendas individuais (RP 6) de 2023 foram na modalidade de transferência especial. Além disso, em 2023, 80% das transferências especiais não especificaram o ente federativo beneficiário.
Para o Procurador-Geral da República, para além de transgredir o pacto federativo e os limites estabelecidos pela própria Constituição para qualquer reforma em seu texto, o processo viola os princípios da impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Ele também argumenta que a sistemática desrespeita a competência fiscalizatória do TCU em relação à utilização dos recursos repassados pela União e o dever do Estado de disponibilizar informações e dados contábeis, orçamentários e fiscais de forma eletrônica e com amplo acesso público. Diante disso, ele solicita que o STF suspenda imediatamente os dispositivos que autorizam as emendas PIX e, ao final do processo, as declare inconstitucionais.
As emendas PIX já são alvo de questionamento na ADI 7.688/DF, movida pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). Contudo, há incerteza sobre a legitimidade da associação para ingressar com a ação direta, uma vez que seus objetivos institucionais não guardam relação temática com o assunto em questão. Visando garantir que o tema seja devidamente apreciado pelo STF, Paulo Gonet optou por mover essa nova ação. O PGR também sugere que, dado que existe uma identidade parcial com o objeto da ADI 7.688/DF, a atual ação direta seja distribuída por prevenção ao mesmo relator, o ministro Flávio Dino.
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