CLEBER DIONI TENTARDINI
PORTO ALEGRE, RS (FOLHAPRESS) – A esteticista ortomolecular gaúcha Giselda Topper decidiu revelar sua história com o ex-governador Leonel Brizola, morto há 20 anos.
Ela possui um teste de DNA que aponta 99,99% de certeza do parentesco, o que, para especialistas, comprova o vínculo.
Giselda ingressou em 19 de agosto de 2005 com uma ação na 13ª Vara de Família do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, que tramitou em segredo de Justiça pela natureza do processo e assim permanece, mesmo depois de extinta.
Os testes foram feitos com sangue dela e de sua mãe e de dois filhos de Brizola, João e Neusa, na clínica Genealógica, Diagnósticos Moleculares, no Rio de Janeiro. O filho José Vicente não participou.
De acordo com o resultado, que saiu em 2008, Giselda é a mais nova e, agora, a única filha viva de Brizola.
“Probabilidade de 99,99% de certeza em favor do vínculo proposto”, assinou, em 31 de janeiro de 2008, o biólogo Rodrigo Soares de Moura Neto. “Resultado que comprova a paternidade”, escreveu.
O Genealógica é o mesmo laboratório que realizou, na década de 1990, os testes de DNA com os irmãos de Ayrton Senna e uma suposta filha do piloto de corrida. Nesse caso, não foi comprovada paternidade.
Giselda se lembra de dois peritos declarando à Justiça que os resultados foram inconclusivos. Foi negada a paternidade.
No dia 19 de maio de 2008, a juíza Monica Poppe Fabiao negou medida cautelar e julgou extinto o processo: “Uma vez que já foi realizado exame genético, não há interesse processual que ampare a pretensão da requerente”, anotou a magistrada.
O biólogo Rodrigo Neto, doutor em ciências e professor-adjunto de genética da Universidade Federal do Rio de Janeiro, não participou de audiências na Justiça. Procurado pela reportagem, ele citou o laudo assinado por ele e disse que desconhece os outros testes de DNA nesse caso.
“O método mais eficiente é o exame feito diretamente com o suposto pai biológico. Quando não se tem o pai para verificar a possibilidade de vínculo, existe a probabilidade estatística de você não compartilhar material genético, mesmo sendo filho, isso se sabe desde o século 19. Mas, quando há amostras de dois ou três filhos do mesmo pai, aí se tem força estatística suficiente para obter um resultado conclusivo, que foi o que realizamos na Genealógica”, explica Rodrigo.
Um suposto laudo inconclusivo, segundo o biólogo, pode ter analisado o DNA só de um filho registrado e da requerente e chegado à conclusão que não conseguiu estabelecer vínculo.
O biólogo Rodrigo Rodenbusch, diretor técnico do Peritos Lab, laboratório responsável pelos exames de paternidade judiciais (AJG) do Rio Grande do Sul, diz que, se um dos resultados dos laboratórios deu positivo, e outros, inconclusivos, “provavelmente os testes não foram feitos com o mesmo número de parentes e a mesma informação genética”.
Rodenbusch, doutor em genética e biologia molecular pela PUC gaúcha, com 21 anos de experiência na área, acrescenta que a utilização da genitora da requerente é fundamental porque, por meio dela, é possível separar o material genético de origem paterna, que é o que se busca identificar.
Naquele ano de 2008, Giselda recorreu da decisão em primeira instância, com a advogada Vanessa Wolf Della Justina, que entrou com pedido de liminar para que fosse garantida a inviolabilidade do túmulo de Brizola, de forma a viabilizar a exumação dos restos mortais. O pedido foi negado, e o processo, arquivado em 2013.
Os três filhos de Leonel com Neusa Goulart Brizola já estão mortos. Neusa morreu em 2011, José Vicente, em 2012, e João Otávio, em 2017.
Os netos que seguiram carreiras políticas, Juliana, Leonel e Brizola Neto, todos filhos de José Vicente, não deram resposta até a publicação desta reportagem.
A ex-companheira do líder trabalhista Marília Guilhermina Martins Pinheiro diz que Brizola nunca mencionou a existência de uma filha fora do seu casamento com Neusa.
Em seu livro de memórias “Minha Vida com Meu Pai, Leonel Brizola” (ed. Planeta, 2016), João Otávio registra os casos de infidelidade do político, que atormentavam sua esposa Neusa, e escancara a fama de mulherengo do pai.
“Sempre soubemos que meu pai teve aventuras com outras mulheres. Os episódios de infidelidade dele foram motivo de brigas, às vezes, discutiam aos berros”, narrou.
Nos anos em que transcorreu o processo judicial, Giselda enfrentava problemas pessoais e teve pouco contato com o seu advogado, Gerardo Xavier Santiago, de outro estado. A OAB carioca cancelou o registro de Santiago. Ele não foi localizado.
A advogada Vanessa, que tentou recurso, está trabalhando para a Justiça, portanto, impedida de exercer a advocacia.
Giselda não tem cópia do processo, tampouco condições de requerer pessoalmente no TJ do Rio de Janeiro acesso aos autos.
“Gostaria de ver os supostos exames que deram o vínculo inconclusivo, mas não tenho condições de viajar ao Rio nem pagar advogado”, explica.
A advogada Tatiane Mandião, especialista em direito de família e sucessões do escritório Buffara e Mandião Associados, de Porto Alegre, explica que uma ação rescisória visando alterar a decisão de um processo que transitou em julgado só pode ser analisada por uma instância superior “se a requerente tiver uma nova prova capaz de lhe assegurar um pronunciamento favorável”.
‘Ele me segurou no colo e deu um relógio de presente’
A mãe de Giselda, Alma Topper, falecida em 2009, aos 77 anos, era de família descendente de alemães do Rio Grande do Sul. Ela tinha 21 anos quando começou a trabalhar para a família Brizola na capital gaúcha. O jovem trabalhista era secretário de Obras Públicas do governo Ernesto Dornelles (1951-1954).
A esteticista nasceu na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, em 29 de novembro de 1954, nove dias depois de Neusa Maria, a terceira filha de Brizola. Giselda está com 69 anos.
Ainda bebê, Giselda foi levada para viver com um tio, no município gaúcho de Feliz. Depois, morou em Viamão e Porto Alegre. Aos 9 anos, foi encaminhada para o Internato Ana Jobim, em Viamão, onde permaneceu por um ano. Um tio lhe contou, anos mais tarde, que foi transportada em um carro preto, com placa oficial.
Naquele ano de 1963, sua mãe, Alma, foi levada para o Rio de Janeiro. O líder trabalhista havia sido eleito deputado federal.
“Foi um período muito difícil quando jovem, eu falava um dialeto alemão, não entendia quase nada de português. E fiquei sem contato com minha mãe. Quando nos reencontramos, a paternidade era um assunto proibido”, diz.
“Fiquei sabendo que Brizola era meu pai por um descuido do meu tio, irmão dela. Mais tarde, eu entendi que ela fez de tudo para me proteger de toda a situação. Somente mais tarde, ela comentou sobre uma foto. Disse que Brizola me segurou no colo e deu um relógio de presente de aniversário.”
E completa: “Neste momento em que todos os envolvidos já se foram, só fiquei eu e a consequência. E o meu teste de DNA. Lembro-me até hoje do dia em que a Neusinha olhou para mim na frente do tribunal e disse: ‘Você é idêntica ao meu pai’. Eu não queria o patrimônio deles, somente o nome do meu pai, por direito, para deixar para meu neto”.
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