Pessoas inescrupulosas (Por Antonio Muñoz Molina)

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Enquanto Sarah Wynn-Williams se dedicava a seu trabalho em um ambiente vibrante e repleto de comodidades, um som estridente rompeu a aparente harmonia. Era o som de uma mulher sucumbindo a uma crise epiléptica, contorcendo-se no chão, cercada por uma equipe de jovens profissionais que pareciam absortos em suas telas, incapazes de perceber a gravidade da situação. A cena se desenrolava em 2015 nas dependências da então Facebook, onde a indiferença reinava acima da empatia. Sarah, diretora de políticas públicas, não hesitou em chamar uma ambulância, mas a falta de apoio ao seu redor a fez questionar sua permanência em um lugar onde o sofrimento humano era ignorado em meio à ambição coletiva.

Após sete anos na empresa, a incerteza sobre seu futuro profissional e o temor de perder a segurança financeira que proporcionava o emprego tornavam sua decisão de sair cada vez mais pesada. Lidar com a pressão do trabalho enquanto enfrentava problemas de saúde durante a maternidade ilustrava o dilema de Sarah – a luta entre vida pessoal e a voracidade corporativa. O controle que Mark Zuckerberg e seus executivos exerciam sobre seus funcionários era um reflexo do desprezo que sentiam pelas vidas que tocavam, moldando um ambiente onde os bilhões abaixo da elite eram apenas números.

Em um livro que retrata sua experiência, Careless People, Sarah cita O Grande Gatsby para descrever a desconexão de seus superiores, que, como Tom Buchanan, destruíam vidas à vontade, refugiando-se em suas riquezas. O conteúdo do livro, que Zuckerberg tentou boicotar, é uma crítica nua e crua a um sistema que prioriza lucro em detrimento da moral. Mesmo em sua opulência, Zuckerberg mantinha hábitos estranhos: enquanto imersos em três estrelas Michelin, seus gostos por fast food revelavam uma persona desigual – um bilionário que desprezava a realidade alheia.

Na verdade, sua irracionalidade era uma constante. O jovem que uma vez hesitou diante das personalidades públicas havia evoluído para um guru impassível cercado por bajuladores. Sua influência era tal que tinha o poder de moldar o destino político de nações, explorando instintos humanos mais sombrios em nome da conquista de espaço no mercado. Como numerosos outros líderes, o crescimento desenfreado se tornava sinônimo de irresponsabilidade e abuso de poder.

Em lugares como Mianmar, o Facebook não era apenas uma rede social; tornava-se um vetor de mentiras, extremismo e até de violência. A capacidade da plataforma de amplificar discursos de ódio e incitação à violência transformava-se em um ciclo lucrativo, onde o sofrimento humano nem mesmo gerava um olhar de piedade. Contudo, a gota d’água para Sarah veio quando ela percebeu que suas convicções não podiam coexistir com um sistema tão corrompido. A decisão de partir foi forçada, mas, de certa forma, libertadora. A demissão, que lhe foi imposta, tornou-se um símbolo de sua liberdade de expressão e integridade.

Neste cenário de excessos e descaso, fica a reflexão sobre o real valor da humanização nas relações profissionais. O que você pensa sobre a ética nas grandes corporações? Compartilhe suas ideias e experiências nos comentários.

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