A história de Vieira, uma diarista de 38 anos, exemplifica a luta de muitos brasileiros em busca de uma vida melhor no Reino Unido. Após ganhar uma moto, ela decidiu passar três anos em Londres para mobiliar sua casa no Brasil e cuidar da mãe e seus três filhos. Porém, seus planos mudaram drasticamente quando, menos de um ano depois da chegada, ela se viu obrigada a considerar um pedido de asilo após ser denunciada, provavelmente por conhecidos da igreja que frequentava.
O recrudescimento das políticas migratórias no Reino Unido tem causado um aumento alarmante nos pedidos de asilo. Entre março de 2024 e março de 2025, cerca de 2,6 mil brasileiros formalizaram essa solicitação. Esse número é significativo se comparado a uma década atrás, quando apenas 21 brasileiros haviam feito pedidos semelhantes em 2014.
Nos últimos dois anos, os dados mostram uma média de 2,4 mil pedidos anuais, e só no início de 2025, 691 brasileiros solicitaram asilo, incluindo 52 crianças e adolescentes. No entanto, de todos os pedidos, 304 foram negados por serem considerados “claramente infundados”. Atualmente, 2.179 brasileiros aguardam decisão, sendo que 1.100 deles já esperam há mais de seis meses.
Um cenário de novas restrições
A ascensão dos pedidos de asilo coincide com o endurecimento das políticas migratórias britânicas. O governo do Partido Trabalhista, em função desde julho de 2024, tem se comprometido a “restaurar o controle” da política migratória, o que se traduz em mais barreiras para imigrantes, complicando ainda mais a permanência para aqueles que já vivem no país.
Mihnea Cuibus, especialista do Observatório da Migração da Universidade de Oxford, destaca que o número de vistos caiu 40% desde a chegada do novo governo. Os esforços para intensificar as deportações têm afetado, drasticamente, a comunidade brasileira, resultando em um aumento de 30% nas deportações de brasileiros no último ano.
Para muitos que não têm uma forma legal de permanecer, como Vieira, o pedido de asilo se torna uma alternativa necessária, mesmo que arriscada. Contudo, o sucesso nesse tipo de pedido é raro, e a maioria acaba sendo negada. Desde 2001, apenas 40 solicitações de asilo de brasileiros foram aceitas, e entre março de 2024 e 2025, 1.492 pedidos foram recusados.
Trapaceando expectativas
Vieira, que conseguiu se esconder quando os agentes do Home Office bateram à sua porta, cogitou solicitar asilo, influencia pela ideia presente em diversos grupos da comunidade brasileira online. Contudo, a realidade é que muitos acreditam erroneamente que a simples obtenção do Cartão de Registro de Solicitação (ARC) lhes assegura a permanência no país.
“Essa carteira não implica que o pedido de asilo foi aceito”, alerta Guilherme Barbosa, advogado com quase 20 anos de experiência no Reino Unido. Francine Mendonça, especialista em imigração, complementa: “Muitos caem na armadilha de falsos advogados que prometem soluções rápidas, mas acabam arriscando ainda mais a vida de quem já está vulnerável”.
O custo de um pedido de asilo pode atingir até 4 mil libras quando realizado por profissionais qualificados, enquanto ofertas de serviços não legítimos giram em torno de 500 libras. Esse cenário alimenta fraudes e aumenta a incerteza de quem busca um refúgio seguro.
O Itamaraty, em resposta a essa crise, está negociando com o Home Office para facilitar o retorno de brasileiros sem permissão legal no país. Porém, para Vieira, a situação é angustiante: “Eu não queria voltar, mas não tenho condições de continuar fugindo. Do dia para a noite, passei a ser percebida como criminosa e eu não sou”, desabafa.
Ela retorna ao Brasil com recordações e a esperança de um dia voltar à Europa, agora com um entendimento mais profundo dos desafios enfrentados pelos brasileiros que buscam oportunidades fora de seu país.
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