O Labirinto das Letras: quando a Geografia decide quem pode falar no Brasil

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OPINIÃO

Confira o artigo do escritor Matheus Peleteiro

Matheus Peleteiro é escritor há 10 anos

Matheus Peleteiro é escritor há 10 anos –

Há uma ferida profunda na literatura brasileira, especialmente nas periferias do nosso mapa. Essa dor é vivida intensamente por nós, escritores baianos, pernambucanos, cearenses e manauaras. Se pudesse nomeá-la, diria que se chama “a surdez sistemática de nossas vozes”. Uma dor que muitos enfrentam em silêncio, temendo que suas críticas sejam vistas como ressentimento, reforçando a ideia distorcida de que toda denúncia reluta em interesses pessoais.

O leitor pode se perguntar sobre o que realmente significa essa ferida. Ela representa a invisibilidade que muitos escritores enfrentam, acreditando que bastaria enviar alguns e-mails para que seus manuscritos chegassem às mãos de grandes editoras. No entanto, a realidade é que, mesmo o direito a um “não” nos é negado, condenando-nos a um silêncio absoluto que engole nossas obras sem ao menos serem lidas.

Um sumiço que nos condena à dúvida permanente: nosso livro foi recusado ou sequer foi lido?

Saber disso aliviaria um pouco a angústia. Permitir-nos-ia encarar a rejeição como um diálogo que não aconteceu, ao invés de nos sentirmos invisíveis. Essa negativa se transforma em uma verdadeira epopeia, exigindo anos de tentativas e articulações em redes que, muitas vezes, nos tratam como produtos descartáveis. A exclusão geográfica se evidencia na educação, onde muitos professores anseiam por apresentar autores locais, mas acabam enfrentando as barreiras de um mercado editorial que privilegia somente vozes consagradas.

O que não é vendido pelo Sudeste raramente é considerado digno no Norte ou Nordeste. Para muitos, o autor só é reconhecido após receber a validação de fora, como se o valor de nossas obras só pudesse ser validado por quem está distante. E quando as editoras finalmente nos “encontram”, impõem suas fórmulas: queremos como retratistas do exótico, enquanto o direito ao universal é reservado a outros.

Nos últimos anos, no entanto, rompemos esse ciclo. A demanda por vozes diversas tem impulsionado uma mudança no mercado literário. Celebramos esse avanço, embora com sentimentos contraditórios, pois reconhecemos que ainda é um caminho longo. Porém, essa mudança traz promessas e novas realidades para o nosso campo literário.

Sonho com o dia em que nossos livros sejam lidos não como curiosidades etnográficas, mas como partes essenciais da literatura nacional. Enquanto esse dia não chega, seguimos na resistência, escrevendo com a coragem de quem foi ignorado, mas que não se intimida frente à grande arte. Queremos ser reconhecidos não como “literatura regional”, mas como literatura brasileira abrangente, que nasce em todas as regiões do país.

Cada obra que ousa atravessar a barreira do mercado editorial nos aproxima desse futuro sonhado. Acredito que, se permanecemos nas gavetas por tanto tempo, conseguimos transformá-las em trincheiras de nossa luta.

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