Na terça-feira, a polícia turca prendeu quatro membros da revista satírica LeMan, acusando-os de “incitar o ódio e desrespeitar valores religiosos” com uma charge que, segundo as autoridades, retrataria o profeta Maomé. A situação gerou protestos e ataques contra a sede da revista, que se defendeu, afirmando não haver relação entre a ilustração e o profeta.
A polêmica caricatura, em preto e branco, mostra dois homens alados. Um diz: “Salam aleikum, eu sou Muhammad”, enquanto o outro responde: “Aleikum salam, eu sou Moisés”. Ao fundo, uma cena de devastação em Gaza, ressaltando a tensão do conflito na região. As figuras aladas foram interpretadas pelas autoridades como Maomé e Moisés.
Hz. Muhammed’le ilgili a?a??l?k karikatürün ard?ndan Leman dergisinin ofisinin önünde protesto gösterisi düzenlendi. pic.twitter.com/TjGZOWnluN
— Millî Gazete (@milligazetecom) June 30, 2025
Entre os detidos, estão o cartunista Dogan Pehlevan e o editor-chefe Zafer Aknar, além de outros profissionais. Mandados de prisão também foram emitidos para dois editores fora do país. A LeMan é conhecida por sua crítica aberta ao governo, frequentemente alvo de ações judiciais e da ira de grupos conservadores ligadas ao regime de Recep Tayyip Erdogan.
Na noite anterior à prisão, a sede da LeMan foi atacada por manifestantes, enquanto outros confrontos com a polícia e ataques a um bar frequentado por funcionários da revista ocorreram. Na terça-feira, novos protestos foram realizados sob forte presença policial, com os manifestantes argumentando que “insultar o Mensageiro de Deus não é liberdade de expressão, é islamofobia”.
Os protestantes entoaram gritos em alusão ao ataque à revista Charlie Hebdo, em 2015, que desencadeou uma onda de violência após a publicação de caricaturas de Maomé.
Ridvan Kaya, líder do grupo Ozgur-Der, afirmou que o ato representa um ataque às religiões e aos valores muçulmanos. Erdogan, por sua vez, caracterizou a charge como uma provocação disfarçada de humor e prometeu que os responsáveis prestariam contas à justiça.
A LeMan, em contrapartida, negou as acusações, afirmando que a ilustração não se referia a Maomé, mas a um homem muçulmano comum com o mesmo nome e que a intenção real era evidenciar a situação difícil em Gaza. Apesar de pedir desculpas por qualquer ofensa, a revista criticou a campanha contra a liberdade de expressão no país.
A controvérsia destaca a fragilidade da liberdade de imprensa na Turquia, que ocupa a 159ª posição no Índice de Liberdade de Imprensa de 2025, segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras. A Media Freedom Rapid Response (MFRR) condenou os ataques à LeMan, exigindo proteção para jornalistas e reafirmando a necessidade de garantir a liberdade de expressão.
Rauf Ceylan, professor do Instituto de Teologia Islâmica, aponta que a indignação em relação a caricaturas de Maomé se baseia em fatores teológicos, históricos e políticos. Para muitos muçulmanos, representações visuais do profeta são vistas como uma ofensa à dignidade religiosa e cultural. Ceylan observa que a mobilização contra tais charges pode ser facilmente amplificada e utilizada por elementos radicais, transformando indignação moral em ações políticas, justificadas por uma suposta ofensa à fé.
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