Segurança x vigilância: comunidade escolar se divide sobre câmeras em sala

Após a aprovação do Projeto de Lei nº 944/2024, a discussão em torno da instalação de câmeras de segurança em escolas públicas do Distrito Federal ganhou destaque. A medida, que inclui dispositivos com áudio, divide opiniões. Para muitos, é uma questão de segurança, enquanto outros a veem como um passo em direção à vigilância excessiva.

A proposta, aprovada na terça-feira (21/10) na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), permite que os diretores decidam sobre a implementação das câmeras nas salas de aula.

Samuel Fernandes, diretor do Sindicato dos Professores do Distrito Federal (Sinpro-DF), criticou a iniciativa, considerando-a “inconstitucional” e um “retrocesso”. Ele defende que a instalação das câmeras representa uma forma de vigilância e censura, o que poderia comprometer a liberdade de ensinar e aprender garantida pela Constituição.

“Esse projeto não traz segurança”, afirma Fernandes. Ele também ressalta que o PL foi discutido sem consulta ao sindicato, o que considera inadmissível. “Precisamos de diálogo e soluções reais”, conclui.

Detalhes do Projeto de Lei

• Autoria dos deputados Thiago Manzoni e Roosevelt Vilela;
• Câmeras devem ser instaladas em locais estratégicos, se aprovadas;
• Conteúdo captado só pode ser acessado mediante solicitação do Poder Judiciário, do Ministério Público ou de órgãos de Segurança Pública;
• Deverá haver aviso visível nos locais com câmeras, informando sobre a captação de áudio e vídeo;
• O projeto segue agora para sanção do governador Ibaneis Rocha.

No dia da votação, em um dos poucos diálogos entre parlamentares e o Sinpro-DF, foi proposta a não obrigatoriedade da instalação das câmeras. A emenda que tornou a implementação facultativa foi aprovada, mas o Sinpro-DF ainda planeja entrar na justiça para contestar o PL. Eles alegam que a intenção do projeto não é garantir uma educação de qualidade, mas criar um ambiente de intimidação.

Atualmente, 533 das 711 unidades de ensino já possuem câmeras instaladas, mas apenas em áreas de circulação. A aquisição é responsabilidade das escolas, através de programas diversos.

Procurada, a Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal (SEE-DF) ainda não divulgou atualizações sobre os próximos passos relacionados ao projeto.

Liberdade de Cátedra em Questão

A liberdade de cátedra, garantida pela Constituição, assegura aos professores a autonomia para ensinar sem interferências. Com a instalação das câmeras, a insegurança sobre como essa liberdade será exercida cresce. A professora Marcela Souto de Oliveira, com 25 anos de experiência, expressa sua preocupação: “Parece uma solução simples para um problema complexo. A discussão não foi ampla o suficiente entre os educadores”, diz.

Ela também teme que falas de professores possam ser distorcidas e usadas contra eles, criando constrangimentos que afetam a relação com os alunos. “Isso limita a liberdade de abordar temas delicados”, completa.

Por outro lado, a professora Jane Márcia de Oliveira crê que a presença das câmeras não mudará sua forma de lecionar, embora reconheça que o tema segurança é um ponto comum entre educadores e parlamentares. Ela cita um caso em que as câmeras ajudaram a esclarecer um mal-entendido envolvendo uma criança, ressaltando sua utilidade em certas circunstâncias.

Opinião de Especialistas em Educação

A decisão sobre a instalação das câmeras agora cabe aos gestores escolares. A supervisora pedagógica Joseneide Montenegro comenta que essa situação é complexa, envolvendo ética e relações interpessoais. “Os gestores estão prontos para não intimidar os professores com as imagens?”, pergunta.

A confiança entre todos os envolvidos é fundamental, segundo ela, para que as gravações sirvam ao aprendizado e não prejudique a imagem dos educadores.

Gorethi Camelo, presidente da Associação de Pais e Alunos das Instituições de Ensino do DF (Aspa-DF), acrescenta que a transição deve ser feita com transparência e destaca o apoio cauteloso da maioria dos pais a essa medida.