Répteis sofrem com uma má reputação. Embora, em várias culturas, crocodilos, cobras e tartarugas já tenham sido venerados como deuses ou símbolos de transformação, no Ocidente a imagem associada ao mal e à traição persiste, herdada de tradições judaico-cristãs. Essa visão nem sempre faz jus à diversidade e às necessidades desses animais. A percepção não é uniforme e depende do contexto cultural, histórico e social.
Essa aversão resulta de uma combinação de fatores evolutivos e socioculturais. Estudos com primatas sugerem que temos predisposição a temer características de cobras por seu potencial perigo, e a distância facial entre répteis e humanos contribui para vê-los como estranhos ou menos inteligentes.
Invisíveis, mas presentes
Os répteis convivem conosco, muitas vezes passando despercebidos diante de aves e mamíferos. O relatório da União Europeia de 2022 sobre animais usados em pesquisa aponta que répteis representam 0,1% dos animais utilizados—mais de 4,5 mil indivíduos, número que quase dobrou em quatro anos. Esses dados referem-se apenas a animais em procedimentos autorizados, excluindo répteis capturados temporariamente.
Muitos répteis em cativeiro permanecem em condições precárias que não atendem às suas necessidades básicas. Répteis de estimação ou de zoológicos costumam passar grande parte da vida confinados, e estudos indicam que a falta de condições adequadas pode gerar problemas de saúde e comportamentais, como o contato repetitivo com o vidro do terrário, que pode causar lesões no focinho.
Estratégias para melhorar o bem-estar
O enriquecimento ambiental surgiu para aliviar essas deficiências, oferecendo aos animais algo para fazer em ambientes pouco variados. Hoje é um campo de estudo e uma ferramenta para melhorar o bem-estar, com objetivos que vão além de apenas suprir carências: visa que os répteis prosperem.
Na prática, isso envolve mudanças no ambiente (brinquedos, estruturas, estímulos sensoriais ou sociais) que promovam comportamentos naturais. O segredo está em adaptar as alterações às necessidades específicas de cada espécie e verificar se elas realmente melhoram o bem-estar.
Em um estudo derivado da minha tese de doutorado, avaliamos a pouca atenção que os répteis têm recebido nesse campo. Primeiramente, consultamos zoológicos europeus para entender como aplicam o enriquecimento ambiental. Embora a maioria pratique enriquecimento, muitas ações chamadas assim não iam além de manter um gradiente térmico adequado.
Em seguida, projetamos e avaliamos propostas de enriquecimento para duas espécies de lagartos do gênero Podarcis. Uma envolvia odores de outros indivíduos (em pedaços de papel), estimulando um comportamento natural de busca por informações. Outra consistia em um toco de madeira com buracos que os lagartos deveriam explorar para encontrar comida. Por fim, aumentamos a complexidade estrutural e térmica do terrário, adicionando plataformas em diferentes alturas.
Para medir o impacto, observamos o comportamento: nos ambientes enriquecidos, os lagartos esfregavam menos o focinho no vidro, dedicavam mais tempo a se movimentar e a estender a língua — sinais de maior exploração de novos estímulos e de uma motivação inata para investigar, que pode ser intrinsecamente gratificante.
Também avaliamos a corticosterona, o hormônio do estresse, nas fezes de forma não invasiva. Os níveis de estresse aumentavam com o tempo no cativeiro, exceto durante as fases de enriquecimento, o que indica um efeito fisiológico positivo do enriquecimento nesses lagartos.
Um longo caminho a percorrer
As descobertas ajudam a desmontar a imagem estereotipada dos répteis. Há evidências de que são animais com capacidades cognitivas e vidas sociais complexas — e até com comportamentos lúdicos — que demandam mais do que costumamos reconhecer.
Apesar dos avanços, muito ainda precisa ser feito. O comércio de répteis é significativo: até 36% das espécies são comercializadas, muitas vezes de forma ilegal. Sabemos pouco sobre a biologia e o comportamento de muitas espécies, mas elas são vendidas como objetos de coleção. O sofrimento pré-venda é comum, com animais mantidos em condições insalubres que não atendem às suas necessidades de espaço, alimentação, temperatura ou umidade.
Após a venda, a mortalidade prematura pode ultrapassar 70%. Além dos problemas de bem-estar, o comércio de animais exóticos também causa danos ecológicos, como a sobre-exploração e a introdução de espécies invasoras.
Nesse contexto, o enriquecimento ambiental é uma oportunidade para educar e conscientizar, ajudando a compreender melhor o comportamento, as capacidades e as necessidades de animais muitas vezes ignorados. Enquanto continuarmos mantendo répteis em cativeiro, garantir seu bem-estar deve ser uma obrigação moral.
Convido você a compartilhar sua opinião nos comentários: qual é a sua visão sobre o enriquecimento ambiental para répteis em cativeiro? Deixe suas ideias, experiências ou perguntas abaixo.

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