Eleição colombiana está dividida entre a inédita vitória da esquerda e uma direita que apoia a Venezuela

Publicado em

Tempo estimado de leitura: 6 minutos

Os colombianos decidem neste domingo, 19, o novo presidente do país. De um lado, o esquerdista Gustavo Petro promete melhorias econômicas. Do outro, o populista Rodolfo Hernández, que não se considera um político, assegura que acabará com a insatisfação com a classe, que há tempos está presente na Colômbia. De acordo com os especialistas, esses são os dois principais problemas e as razões pelas quais candidatos da direita tradicional, bastante populares em um passado recente, não passassem para o segundo turno. �??Cada um deles reúne, de maneira geral, uma insatisfação�?�, aponta o professor de relações internacionais da PUC, Arthur Murta. 

Nas pesquisas publicadas no último dia 13 de junho, Petro e Hernández aparecem empatados. Analistas colombianos já cogitam que a eleição possa ser decidida por uma diferença de 300 mil votos caso os números se mantenham como estão. Apesar dos posicionamentos diferentes, os candidatos têm em comum o desejo de mudança. Mesmo com a eleição divida entre esquerda e direita, os especialistas explicam que a Colômbia ultrapassa a barreira da polarização. 

eleição na Colômbia

Ascensão de Rodolfo Hernadez 

O desejo por um presidente que cumpra suas promessas �?? já que o atual, Iván Duque Márquez, está totalmente desacreditado �?? faz a disputa ser ainda mais acirrada. Segundo as pesquisas, a vantagem de Petro no primeiro turno já foi pulverizada. Em algumas delas, Hernandez, desacreditado durante a maior parte da corrida eleitoral, é cotado como vencedor. O empresário anti-sistema virou o jogo com seu discurso combativo e chegou forte para vencer a eleição. �??Ele conseguiu se comunicar com a população sendo esse candidato que combate os poderosos, que está fora da política�?�, pontua Murta. Eduardo Fayet, professor de relações internacionais e governamentais do Mackenzie, explica que a decrescença da estrutura do sistema politico tradicional dá vantagens para os que se apresentam como novos, o que fez a população buscar um candidato que �??trará a solução para os seus problemas�?�. 

rafael hernandez

Candidato presidencial colombiano Rodolfo Hernandez parou de fazer aparições em público após alegar que sua vida está em risco�??Eva Marie Uzcategui/AFP

Para Tomaz Paoliello, professor de relações internacionais da PUC, esse fenômeno do candidato desacreditado, que aparentemente surge do nada e se defende dessa forma, já virou uma cartilha. O exemplo mais clássico é o de Donald Trump, ex-presidente dos Estados Unidos. Vale lembrar que Hernández é constantemente comparado ao norte-americano, empresário como ele. Ricardo Leães, professor de relações internacionais da ESPM, relembra a que o �??outsider�?� colombiano não participou de campanhas em termos virtuais e utilizou muito o TikTok.

Os especialistas citam que o plano de governo de Hernández não é claro. Mas, de alguma forma, �??ele conseguiu angariar boa parte dos votos dos setores que já votavam na direita�?�, destaca Leães. Apesar de se considerar um candidato de direita, o empresário defende pautas como a liberação das drogas e o aborto. Além disso, prometeu reestabelecer relações diplomáticas com a Venezuela e reconhecer Nicolas Maduro como seu presidente. Para o catedrático, isso �??acabaria produzindo uma mudança muito significativa em termos de relações internacionais�?�. �??Podemos esperar algumas surpresas que acabem impactando os demais países da região.�?�

Esquerda no poder pela primeira vez

Uma conquista inédita está em busca nesta eleição: a chegada da esquerda ao poder. A Colômbia já elegeu candidatos com ideias progressistas no passado, mas nunca um ligado a movimentos sociais e de origem popular como Gustavo Petro. Essa já é a terceira vez que ele disputa a presidência, sendo que na última ficou em segundo lugar. Caso ganhe neste ano, conseguirá algo nunca presenciado. �??Se a esquerda for para o poder, vai ser uma virada interessante para observarmos como setores empresariais vão se portar�?�, observa Arthur Murta. Entretanto, quando se fala na vitória de Petro, existe uma divisão de pensamento entre os especialistas. Para Ricardo Leães, é preciso esperar para ver �??se o resultado vai ser bem aceito ou se será contestado�?�. Ele relembra que a Colômbia tem um histórico de �??assassinar candidatos de esquerda�?� e que, durante o primeiro turno, Petro �??precisava utilizar coletes à prova de balas e andar com segurança devido ao cenário perigoso�?�.   

Gustavo Petro

Gustavo Petro, candidato de esquerda à presidência da Colômbia, venceu o primeiro turno das eleições ao conquistar 40% dos votos �??EFE/Mauricio Dueñas Castañeda

Há uma preocupação sobre como os grupos paramilitares vão se comportar, já que um dos planos do governo de Petro é combatê-los �?? e também as forças armadas não estaduais. �??Se ele vencer a eleição, poderá haver uma espécie de terceiro turno�?�, alerta Leães. Arthur Murta acredita que o ex-guerrilheiro conseguirá assumir o poder, apesar da possibilidade de manifestações. �??A esquerda já conseguiu ter maioria no Congresso�?�, lembra o professor. �??O cenário que temos agora é a esquerda dando sinal de avanço desde 2021. Quem pode ter mais dificuldade para governar é a direita�?�, acrescenta. Eduardo Fayet também defende que Petro vai assumir o cargo se eleito. O que pode acontecer, conforme o tempo passe, é uma instabilidade política maior na Colômbia �??caso ele consiga ou não incrementar algumas ações relativamente rápidas e efetivas�?�. 

Os desafios do vencedor 

Independentemente de quem vencer a eleição no domingo, os desafios vão ser grandes no próximos anos. �??A Colômbia está passando por uma crise política, social e econômica�?�, explica Murta, apontando que o país enfrenta um processo de desaceleração econômica e está com alto índice de desemprego e pobreza. �??O novo presidente precisa pensar: qual o local de inserção internacional da economia da Colômbia hoje?�?� Eduardo concorda. Para ele, o eleito precisará gerar renda e emprego para a população para conseguir investir �??em uma mudança estrutural razoável�?�.

eleição na colombia

Gustavo Petro e Rodolfo Hernández disputam a eleição presidencial na Colômbia neste domingo, 19 �??RAUL ARBOLEDA/AFP

O segundo desafio está relacionado à parte social, agravada pela pandemia de Covid-19 e o aumento do índice de desigualdade. �??O tecido social político da Colômbia também está rompido. O próximo presidente vai precisar costurar�?�, prevê Murta. Um terceiro ponto que precisará ser trabalhado é a questão da paz, uma pauta importante neste país. �??Qualquer presidente colombiano tem desafio de colocar fim em um conflito de muitas e muita décadas�?�, explica Ricardo Leães. Para ele, é urgente que a Colômbia consiga que os grupos paramilitares e guerrilheiros deponham suas armas e o país alcance �??certa normalidade�?�. 

O professor também fala sobre a necessidade de o governo voltar a ter controle sobre todo o território, fazendo com que não haja mais �??risco de que grupos insurgentes exerçam um papel maior do que devem exercer�?�. Eduardo complementa informando que podemos considerar esse desafio como uma �??estabilidade social�?� e que ela deve ser desdobrada em três fatores importantes: acordo com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), não gerar uma reação popular no sentido de contestação das decisões presidenciais e combate à violência policial. �??Esses três aspectos juntos é uma forma de melhorar a maturidade da democracia colombiana, que ainda é jovem.�?�

Que você achou desse assunto?

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

- Publicidade -

ASSUNTOS RELACIONADOS

Dois ucranianos morrem esfaqueados na Alemanha: suspeito é russo

As autoridades da Alemanha detiveram, na noite de sábado, um cidadão russo-alemão por ser suspeito de esfaquear até à morte dois ucranianos, na cidade de Murnau, no sul do país.  De acordo com a imprensa alemã, o crime aconteceu nas imediações de um centro comercial da cidade, na Alta Baviera, por volta das 17h20 locais.

Menina de 2 anos doa medula e salva vida a irmã com leucemia

Ruby Leaning foi diagnosticada com leucemia linfoblástica aguda em 2020, quando tinha apenas seis anos. Depois de vários testes, a sua irmã, então com dois anos, Mabel Leaning, surgiu como uma "combinação perfeita" e a doação da medula acabou salvando a sua vida. Segundo o SWNS, um serviço de notícias britânico, citado pela Fox News

Portugal nega reparação a ex-colônias e Brasil cobra ações concretas

O governo de Portugal quebrou o silêncio e negou, por meio de um comunicado, qualquer intenção de avançar com um “processo ou programa de ações específicas” relacionados à reparação das ex-colônias. O documento foi divulgado no último sábado (27), após nova fala do presidente do país, Marcelo Rebelo de Sousa, sobre as ex-colônias. “Não podemos