O dilema da cozinheira multifuncional

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Quero dividir um dilema: sou multi.

Multi de mapa astral, multi circunstancial, multi por estratégia de sobrevivência, multi por trauma, repetição, afobação; multi por talento, fuga, excelência, falta de escolha.

Mas até que ponto é bom ser multi, essa coca-cola toda? Dá dinheiro? ?? bom pro coração? Traz felicidade? Vale a pena?

Escrevo essa coluna de hoje na esperança de que até o final do texto eu consiga, como num trabalho de metodologia científica, desenvolver essa problemática e chegar a alguma conclusão. Será?

O lado bom de uma cozinheira livre e com vários talentos é o percurso cheio de experiências mil, uma a cada dia ??? especialmente para as sagitarianas.

(Pausa para a página musical: ???Minhas ambições são dez, dez corações de uma vez, pra eu poder me apaixonar; dez vezes a cada dia, setenta a cada semana, trezentas a cada mês??? ??? beijo Marina Lima!)

Ela cria projetos, escreve, comunica, decora, ensina, treina, faz design, playlists, aconselha e traz a sua alegria de volta em duas semanas de produção de sua festa de aniversário, e antes que eu me esqueça, cozinha até direitinho.

Para as/os contratantes então… pense aí: coisa de 10 profissionais em uma só. Fica super em conta, e aí é que está.

Cozinheiras multi se divertem, são populares, recebem muitos aplausos, mas é cansativo. Percorrem muitas outras paisagens de encantar os olhos, mas em geral fazem menos dinheiro, porque no meio de tantos projetos e convites interessantes, como é que foca, flanando assim distraída nesse cenário de tantas emoções, tal qual a imagem da Boba do Tarot? 

Uma coisa é certa: esse estímulo à criatividade, esses muitos olhares em todas as direções, estas muitas perspectivas e diálogos, informações e experiências de tantos diferentes mundos percorridos abrindo cada vez mais a nossa percepção, configuram incalculável fortuna que ninguém leva da gente. O grande desafio é transformar essa fortuna, essa criatividade toda, em moeda corrente e abundante de pagar boleto, previdência, pé de meia e conforto para gozar loucamente a velhice, viajando agora a lazer, de cabelo azul, naquele momento delicioso da vida quando a gente aprende definitivamente a apertar o foda-se – com o perdão da palavra libertadora.

Eu costumo brincar comigo mesma me olhando no espelho e perguntando: Mulher, por que tu não fez que nem as amigas padeiras; que nem Jessica Augusta e Andrea Torres que foram dar aula; que nem as comadres boleiras Rafa Galvão e Raquel Moraes, a querida família Atelier Bombom, ou até mesmo Carol Moreninha multi que nem eu, mas que tomou juízo e resolveu investir e focar em cerâmicas?

Porque eu não sei, e não dá mais tempo de fazer BI. Porque não posso ignorar essa natureza selvagem, mas posso aprender a domá-la; usar de força, inteligência e bom senso; buscar amparo na terapia, no I Ching, na macumba, onde for, e abrir um espaço entre os livros de astrologia pra tacar, quando nada, um que seja de educação financeira.

Talvez não seja mais o caso de desprender energia vital em tantos pequenos projetos lindos, encantadores, conceituais e cheios de ótimas intenções, porque prazer e emoção foi o que mais tivemos até agora. Talvez seja hora de focar em fazer dinheiro e tomar a parte que nos cabe nesse latifúndio. 

Porque, amores, chega uma hora em que começa a faltar corpo, e nesse desacelerar de velô é que a gente começa a perceber o quanto de concreto construímos e, mais importante, o que ainda precisa ser construído. ?? quando a gente começa a fazer as contas de tempo de vida, de morte, de valores morais X financeiros, e finalmente, pela primeira vez, troca a assinatura da Cult pela Financial Times.

Sim, essa coluna tem conclusão: foco, bebê!

COUSCOUS MARROQUINO MULTIFUNCIONAL QUE NEM EU

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(Foto: Divulgação)

Couscous escrito assim é o de semolina, de origem árabe; quando de milho é cuscuz mesmo.

Orna super tanto com qualquer tipo de proteína vegetal ou animal, quanto com vegetais, oleaginosas, ervas e especiarias, por isso ganha fácil status de multifuncional que nem eu.

Pra mim o grande segredo de um bom couscous não são nem os apetrechos, mas o caldo que será usado para hidratá-lo, levando sabor para dentro de cada grão. Caldo de legumes, frango ou carne, contanto que seja caseiro, vai fazer enorme diferença.

?? hidratar conforme as instruções do fabricante, deixar derreter uma colher de ghee pra soltar os grãos (eu uso as pontas dos dedos para isso) e acrescentar o que você eleger. 

Eu gosto de oleaginosas levemente tostadas, um ponto doce – de damascos, figos turcos ou uva-passa branca, folhas de hortelã e fundamentais raspas de limão, siciliano de preferência.

Assim desse jeito é perfeito para acompanhar carnes marinadas assadas, especialmente aves e suína; mas também fica maravilhoso como prato único – com adição de jardineira de legumes, camarão, cubinhos de frango, queijos duros, e o que mais te der na telha.

Importante é ser multi! Ou não.

* Kátia Najara é cozinheira e empreendedora criativa do Piteu Cozinha Afetiva

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