Rubim vê barreiras para reconstrução da Cultura e rechaça alinhamento automático de políticas federais e estaduais

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O professor, pesquisador e ex-secretário estadual de Cultura, Albino Rubim, comentou, em entrevista ao Bahia Notícias, as possibilidades de mudança nas políticas culturais no estado e no Brasil para os próximos quatro anos, com as mudanças nos comandos tanto do Ministério da Cultura (MinC) quanto na Secretaria Estadual da Cultura (Secult). De acordo com ele, há possibilidade de alinhamento entre as gestões federal e estadual na Bahia, mas ele não é automático.

Rubim ponderou que, mesmo sendo administrações do mesmo partido – o PT – e o MinC estando recheado de baianos – ele citou a ministra Margareth Menezes; o secretário nacional da Diversidade Cultural, Zulu Araújo; e João Jorge Rodrigues, presidente da Fundação Palmares -, o que determina o alinhamento é a elaboração de projetos e atividades comuns.

“Não faz sentido a Secretaria da Cultura do Estado não ter uma política alinhada com a política cultural nacional. Mas não são coisas automáticas. Depende muito de perfis, de quem está na direção. Mesmo sendo do mesmo partido, não é inevitável. Depende de políticas concretas e essas políticas, tanto a nível nacional quanto a nível local, ainda estão se esboçando. Até porque os governos estão começando agora. É possível dizer que há um potencial grande de convergência, mas não é necessariamente inevitável”, avaliou o professor da UFBA.

Já em relação a um possível alinhamento entre políticas federais e estaduais com a esfera municipal, Rubim demonstrou ceticismo. Mesmo com a escolha do empresário Pedro Tourinho, próximo de importantes setores da cultura baiana, o pesquisador vê grande possibilidade de não haver convergência entre os entes.

“Pedro Tourinho é o secretário de Cultura, mas não é o prefeito. Ele é subordinado ao prefeito da cidade e isso conta. Não é que eu esteja subestimando o papel dele. Por exemplo: eu fui secretário [estadual] de Cultura e, na época, Fernando Guerreiro [presidente da Fundação Gregório de Mattos] já estava na prefeitura. Nós não tivemos nenhum problema, fizemos coisas juntos, dialogamos bastante. Mas é diferente de você ter o mesmo partido em vários lugares, em várias instâncias de governo”, afirmou Rubim, que esteve na Secult entre 2011 e 2014, o segundo mandato da administração de Jaques Wagner (PT).

O ex-titular da Secult também comentou uma carta, assinada por ele e pelo também ex-secretário Márcio Meirelles (2007-2011), em que pediam respeito do governador eleito Jerônimo Rodrigues (PT) pela Cultura. O documento foi entendido, na época, como uma crítica à escolha de Bruno Monteiro como novo secretário da Cultura. Rubim, entretanto, nega.

“Eu não queria que aquela carta que assinei com Márcio [Meirelles] – nós fizemos juntos – fosse entendida como alguma coisa em relação ao nome de Bruno [Monteiro]. Não era isso. Naquele momento, havia uma ameaça muito mais complicada, que era ir para a Fundação Cultural uma pessoa claramente do perfil do Turismo. E aí voltaria aquela lógica, que predominou na Bahia durante muito tempo, de subordinar a Cultura ao Turismo”, disse Rubim.

“O que nos moveu naquele momento era também essas coisas. Não era voltado especificamente para Bruno. Era mais geral: as instituições da Cultura deveriam ser da Cultura e, portanto, voltada às políticas de Cultura e não às políticas de Turismo. É que, quando vocês pegam a carta, várias pessoas entendem de várias maneiras”, continuou o pesquisador.

Para Rubim, a reconstrução da cultura brasileira após o governo de Jair Bolsonaro (PL) enfrentará um grande desafio, que passa longe do financeiro. Apesar do orçamento recorde de R$ 10 bilhões para o MinC, o estudioso da área vê barreiras levantadas pela “guerra cultural” estabelecida pelo bolsonarismo.

“Nós temos agora uma situação muito mais difícil e muito mais fácil ao mesmo tempo. Porque se tem dinheiro como nunca o Ministério teve, porque, no máximo, no período de Juca você teve R$ 2 bilhões ou R$ 3 bilhões de orçamento. Agora tem R$ 10 bilhões. Outro mundo. Mas a situação é muito complicada, porque não tem como você fazer um Ministério da Cultura hoje desconhecendo toda essa guerra cultural que aconteceu e acontece no Brasil. Com a emergência de determinados valores extremamente conservadores, valores fascistas, de segregação aos nordestinos, aos negros, coisas desse tipo. O campo cultural não pode fingir que o campo dos valores não pertence ao campo cultural”, afirmou Rubim.

“Essas ideias alucinadas que estão aí, a Cultura tem algo a dizer sobre isso, se ela quiser ser séria. Ela não pode fingir que o negacionismo e o terraplanismo não têm nada a ver com a Cultura. Isso tem tudo a ver com a Cultura, então a Cultura tem que colocar isso na sua agenda. É central, para a gente poder sair desse mundo alucinado para onde Bolsonaro levou o país”, continuou o pesquisador.

Como caminho para superar as dificuldades, Rubim propõe uma parceria entre o Estado e as universidades, que poderiam contribuir na formulação de políticas culturais através de estudos e pesquisas.

“Lá no Ceará, aconteceu uma experiência muito interessante, de colaboração entre a Universidade Federal do Ceará e o governo estadual do Ceará, quando o governador era Camilo Santana [hoje, ministro da Educação, do PT]. E essa colaboração aconteceu inclusive no campo da Cultura. O governo do estado fez um convênio, repassou um recurso para a universidade, para que ela pudesse analisar temas que interessassem ao governo do estado e produzir conhecimento nessas áreas”, exemplificou.

“Esse tipo de colaboração é muito importante. Nós temos um problema sério na Cultura que é a falta de dados, de informações. Muitas vezes há dificuldades para a elaboração de políticas. E a universidade pode ajudar muito nesse sentido, de fazer pesquisas, estudos, porque as políticas precisam ter bases em pesquisas e estudos, não podem ser criadas a partir do nada, têm de ser criadas a partir de um conhecimento da realidade”, concluiu Rubim.

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