Mara era uma aluna que se saía bem na escola, mas na faculdade as distrações com o celular começaram a atrapalhar. O que parecia simples desvio de atenção revelou uma realidade cada vez mais comum: o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade, o TDAH, que pode não ser identificado até a vida adulta.
A história de Mara ganhou contornos clínicos quando, após um episódio depressivo e tratamentos frustrados, a psiquiatra sugeriu o teste para TDAH. O diagnóstico trouxe clareza: o que parecia fracasso pessoal era o efeito de um funcionamento cerebral diferente, com obstáculos que nem todos precisam enfrentar.
Estudos indicam que entre 2% e 3% dos adultos têm TDAH. Na Alemanha, dados de planos de saúde mostram incidência entre 0,2% e 0,4%. Entretanto, dados de 2015 a 2024, publicados na Ärztelblatt International, mostraram que as novas ocorrências entre adultos segurados passaram de 8,6 para 25,7 por 10 mil pessoas, quase triplicando a taxa anterior. Nos Estados Unidos, o número de adultos diagnosticados mais que dobrou nas últimas duas décadas.
Segundo Swantje Matthies, psiquiatra do Hospital Universitário de Freiburg, o TDAH em adultos tem sido diagnosticado com mais frequência nos últimos dez anos, provavelmente porque muitos adultos com o transtorno não recebiam o diagnóstico até então.
Mito ou fato: o TDAH é uma condição da infância
Foi por muito tempo associado apenas à infância. Hoje sabe-se que o TDAH tem uma contribuição genética significativa — até 80% de causas genéticas — e pode estar presente desde o nascimento. Além disso, as diferenças de gênero ajudam a explicar parte do diagnóstico tardio: meninos costumam apresentar hiperatividade e impulsividade mais evidentes, enquanto meninas exibem sinais menos perceptíveis, confundidos com depressão. Nas estatísticas atuais, as jovens já são diagnosticadas com maior frequência, e na vida adulta os diagnósticos se equiparam aos dos homens. Os sintomas podem ainda se transformar: hiperatividade tende a virar inquietação interna, porém os problemas de atenção persistem.
Como é o diagnóstico em adultos?
O diagnóstico em adultos é complexo e exige entrevistas detalhadas, questionários e a reconstrução da história de vida do paciente. É essencial confirmar que os sintomas já estavam antes dos 12 anos e que continuam causando limitações hoje. Também é preciso descartar outras condições que possam explicar as dificuldades de atenção.
Por que os diagnósticos aumentaram?
Entre as razões apontadas estão maior conscientização da sociedade, mudanças nos critérios de classificação e o impacto da pandemia de covid-19 na saúde mental, que levou mais pessoas a buscar ajuda. O aumento não significa necessariamente que o TDAH ficou mais comum, mas sim que os métodos de diagnóstico melhoraram. Ainda faltam pesquisas para esclarecer as causas; pode levar tempo para que os números se estabilizem.
As redes sociais também ampliam a visibilidade do tema, o que incentiva mais pessoas a buscar avaliação. Embora haja conteúdo positivo ao informar e desestigmatizar, ainda há muita informação imprecisa e exagerada, segundo especialistas.
O que muda com o diagnóstico — e o que não muda
Para muitos, o diagnóstico funciona como um ponto de virada. Mara, por exemplo, passou a receber tratamento com terapia comportamental e medicação, o que reduziu o peso dos desafios diários. Ao mesmo tempo, descobriu que o TDAH pode trazer qualidades como entusiasmo e capacidade de fazer conexões. O transtorno também oferece pontos fortes, desde que haja estratégias para lidar com as dificuldades do dia a dia.
O diagnóstico não transforma tudo de uma vez. Em muitas pessoas, os impactos variam conforme o ambiente e o suporte disponível. A inclusão no mercado de trabalho, por exemplo, pode exigir ambientes menos estimulantes, horários mais flexíveis e reconhecimento dos pontos fortes de quem tem TDAH. A medicina e a psicoterapia continuam a ser pilares para reduzir sintomas e aumentar a funcionalidade.
Como tornar a sociedade mais inclusiva para quem tem TDAH?
A especialista destaca a necessidade de preparo em várias áreas para lidar com TDAH. Nichos de atuação que valorizem talentos específicos e ambientes de trabalho que respeitem o ritmo de cada pessoa ajudam a potencializar habilidades. A ideia é criar espaços onde as qualidades únicas de quem tem TDAH sejam reconhecidas, sem exigir conformidade rígida que prejudique a produtividade e o bem-estar.
Mara acredita que todos ganham com uma sociedade mais inclusiva. Pesquisas mostram que ambientes de trabalho com opções de horários flexíveis e locais de trabalho que reduzem estímulos excessivos podem beneficiar não apenas quem tem TDAH, mas qualquer pessoa que busque melhor equilíbrio entre foco e bem?estar.
Você já percebeu sinais de TDAH em si mesmo ou em alguém próximo? Compartilhe suas observações e experiências nos comentários para enriquecermos a conversa sobre diagnóstico, tratamento e inclusão no cotidiano.










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