As declarações do presidente da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg), Flávio Roscoe, relacionando as críticas à mineração na Serra do Curral a motivações políticas e a fake news repercutiram mal entre parlamentares e ambientalistas. Ontem, o dirigente convocou entrevista para defender o licenciamento concedido pelo governo estadual à Taquaril Mineração S.A (Tamisa) e chamou de ???tumulto ambiental??? as reações contrárias ao empreendimento.
???Não sou filiado a nenhum partido político, tenho minhas posições, que são principalmente em defesa da sustentabilidade ambiental e da justiça social (…) Essa retórica (de Roscoe) é vaga e já é conhecida pela sociedade. Uma ampla gama de setores da sociedade civil não vai suportar mais o avanço do poder público em detrimento do interesse público???, afirmou o sociólogo e conselheiro do Parque Florestal Estadual da Baleia, Flávio Torre, que se opõe ao projeto.
Integrante do movimento Tire o Pé da Minha Serra, a ativista Jeanine Oliveira, afirmou: ???Quando ele diz isso, deve estar falando do governador do estado (Romeu Zema) para se reeleger. Pauta política diz muito mais sobre eles do que contra nós, mas estamos em uma democracia, temos que saber criticar e ouvir???.
A concessão foi decidida pelo Conselho Estadual de Política Ambiental (Copam) na madrugada de 30 de abril. Desde então, uma forte reação de ambientalistas foi desencadeada. Roscoe tentou minimizar a questão. ???Dizem, agora, nas redes sociais, que o processo de mineração na Serra do Curral da Tamisa foi aprovado na calada da madrugada, mas não foi assim. Mais de 100 pessoas se inscreveram e falaram, muitas para protelar e tentar que se suspendesse a sessão. Não foi um ato escuso.???
Para o arquiteto e professor da UFMG Roberto Andrés, no entanto, a votação por volta das 3h chama a atenção para uma ???obsessão??? que precisa ser explicada. ???Por que ir contra a posição pública? (…) A política vem deles, são eles que estão tentando defender a todo custo um empreendimento com uma série de problemas claros???, completou.
Apesar da presença de cactos ameaçados de extinção e grutas com fauna ainda em estudos na área de influência das cavas projetadas pela Tamisa, como mostrou a reportagem do Estado de Minas, Roscoe afirmou que os impactos serão mínimos e compensados. Jeanine Oliveira, entretanto, lembra que ???a mancha de interferência biótica vem até a Praça Floriano Peixoto (Bairro Santa Efigênia, Leste de BH)???, citando o estudo de impacto da Tamisa.
Roscoe disse ainda que a mineração na serra geraria 2 mil empregos com mão de obra local e R$ 4 bilhões em impostos em 10 anos. Professor da UFMG, Roberto Andrés rebateu: ????? uma falácia, a mineração gera pouquíssimos empregos, a indústria extrativista representa 4% do PIB (Produto Interno Bruto) e 0,5% da geração de empregos no país. Além disso, é pouco taxada, com pouco retorno direto para a população local???.
As reações também foram ouvidas na Câmara Municipal. Bella Gonçalves (Psol), vereadora de Belo Horizonte, chamou de “leviana” a posição expressada pela Fiemg e destacou risco de desabamento do Pico Belo Horizonte.
Na Assembleia Legislativa, deputados articulam uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar as circunstâncias do processo que culminou na licença dada à mineradora. Até o início da noite de ontem, já haviam sido colhidas 19 das 26 assinaturas necessárias para instaurar o comitê.
André Quintão (PT), um dos signatários do pedido de CPI, crê que o presidente da Fiemg trafega “na contramão” do pensamento majoritário no estado. “Ao que me consta, o Ministério Público, juristas, conselhos e entidades da sociedade civil não disputam cargos eletivos neste ano. O problema é que, em Minas, alguns setores econômicos querem impor seus interesses, sem um debate???.
Integrantes da Comissão de Minas e Energia convocaram a secretária de Meio Ambiente e presidente do Copam, Marília Melo, para explicar a concessão. (Com GP)
Opinião do EM
O erro da federação
O presidente da Fiemg, Flávio Roscoe, convocou a imprensa onem com dois objetivos. O primeiro deles, legítimo como um dos representantes do setor produtivo do estado, foi o de defender a realização do empreendimento. O outro, equivocado, foi a acusação de que os protestos contra a atividade mineradora na Serra do Curral têm relação com “candidatos e grupos” por estarmos em um ano de eleições. A preservação de um dos símbolos de Minas Gerais é um tema que mobiliza toda a população, não apenas políticos ou ambientalistas. Reduzir a um interesse eleitoral à reação forte e imediata da comunidade é um erro. Preservar o que ainda pode ser preservado em nosso estado não é uma questão de votos: é uma questão de respeito ao que sobrou de um de nossos patrimônios ambientais.
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