Foto: Allan Torres/PCR
Multidão aglomerada durante o Galo da Madrugada de 2016, sob a estátua gigante da alegoria
O Galo da Madrugada volta a lotar de foliões as ruas do Recife, capital de Pernambuco, neste sábado, 18, após uma espera de dois anos, por causa da pandemia da Covid-19. Apontado como maior bloco de Carnaval do mundo pelo Livro dos Recordes (Guinness World Book) desde 1995 até hoje, a agremiação deve reunir mais de 2 milhões de pessoas de uma só vez neste ano, segundo expectativas da organização do evento. O bloco completa 45 anos em 2023, se reafirmando como uma das atrações mais esperadas das festas de Momo e uma das mais emocionantes para muitos. Há quem não deixe de ir ao Galo por nenhum motivo, fazendo da ocasião anual uma tradição de família que alimenta o corpo e o espírito para se manter bem durante o restante do ano. É o caso da professora aposentada Lucimery Monteiro, 53, que vive na cidade de Carnaíba, no Sertão pernambucano, a 420 quilômetros de distância da capital ou seis horas de carro na estrada. Ela diz que só não foi ao bloco em duas ocasiões: quando teve sua primeira filha, poucos dias antes da festa, e nos dois anos da pandemia. Agora, mesmo lutando contra um câncer que reapareceu, Lucimery diz fazer questão de reviver as emoções do bloco: “É uma paixão que vai ser até o fim”, disse em conversa com o site da Jovem Pan.
“Eu brinco o Galo da Madrugada há mais de 28 anos, desde quando ainda era solteira. Depois de casada continuei indo. Todos os anos, a gente vem e fica na casa da minha irmã, no Recife. Sou uma apaixonada pelo Galo, e o meu esposo desenvolveu esse mesmo amor. No sábado cedinho estamos sempre lá na saída do bloco, na Praça Sérgio Lorêto. Nunca ficamos em camarote, sempre nos fantasiamos e brincamos na rua. A paixão pelo Galo da Madrugada é uma coisa única. É onde tudo começa. É o lugar que, se eu não for, não houve Carnaval para mim. Todos os anos, quando toca o hino do Galo, na voz de Almir Rouche, que ele começa ‘Galo, eu te amo’, eu me emociono muito, choro mesmo. É uma experiência única”, comenta a aposentada. Ao falar sobre a multidão que prestigia o bloco todos os anos, Lucimery diz colocar sua alegria na frente do medo: “Enfrentar o Galo da Madrugada é para os fortes, é para quem gosta… É para quem gosta de folia mesmo!”, reforça.
No 44º desfile do Galo da Madrugada, neste sábado de Zé Pereira, as principais tradições do bloco são retomadas, desde sua estátua gigante – um dos maiores símbolos da festa pernambucana de Momo – montada na Ponte Duarte Coelho, no centro do Recife, até a enorme quantidade de atrações e a longa duração do evento. Ao todo, serão seis carros alegóricos e 30 trios elétricos, com mais de 50 artistas e bandas tocando músicas ininterruptamente em um percurso de 6,5 quilômetros, das 9 horas até às 18h30. O folião Luiz Carlos Mendes, 60, que vai ao bloco há 40 anos seguidos, período interrompido apenas pela crise sanitária, relembra a falta que a maratona da agremiação deixou na sua vida: “Ficou um vácuo, uma lacuna horrível, falta mesmo, dor no peito. Sentia uma angústia me questionando se haveria novamente o Galo da Madrugada ou se eu iria sobreviver à pandemia para ir a um próximo Galo. E consegui. Conseguimos”.
Ansioso para chegar ao bloco neste sábado, Lula, como é apelidado pelos amigos, faz referência a uma “magia” presente no desfile. “Prefiro a surpresa, o glamour, a espera sobre o que eu vou ver. É belíssimo encontrar a irreverência e a alegria do povo. O Carnaval de Recife é irreverente, lúdico, barato, com qualquer dinheiro se brinca. Não precisa ter status também. Aqui se brinca Carnaval de verdade. Aqui se vive Carnaval. Para mim, é uma das festas mais bonitas que existe. Você sente a liberdade das pessoas, dos brasileiros, principalmente dos nordestinos, povos tão massacrados. É a oportunidade que o povo tem de se divertir e ser feliz. Tudo aquilo que acontece no Galo é muito bonito, não tem explicação”, comenta. Para ele, a tradição de ir ao bloco é tamanha que até o lugar onde estaciona o carro todos os anos é o mesmo. Na multidão, também costuma ficar sempre na mesma região, perto da saída dos trios elétricos e carros alegóricos, de modo que possa ver tudo com tranquilidade, chegando pouco depois das 7h e indo embora próximo às 14h. Sobre o futuro, Lula aposta em muitas outras edições participando do bloco: “Tudo depende de Deus. E como eu sei que Deus é alegre, vai ter Galo da Madrugada sempre. Isso vai continuar passando de geração para geração. Vai se perpetuar”.
Apesar do contingente de 4.200 agentes de segurança mobilizados pelo governo do Estado de Pernambuco para o Galo da Madrugada, como em praticamente toda festa de Carnaval pelo Brasil, sempre ocorrem casos de violência. Com medo, alguns foliões não se arriscam a ir para o meio da multidão, mas também não experimentam perder a festa. A tônica no Recife é encontrar a forma mais confortável e segura para não deixar de ir ao bloco, ainda mais nessa retomada após dois anos, fazendo jus ao tema da festa de Momo na cidade: “Voltei Recife com todos os Carnavais”.
A comerciante Claudete Nascimento, 47, e seu marido, o funcionário público Romero Lopes, 58, confirmam presença, mas preferem ficar em um camarote. “Meu romance com o Galo tem muito tempo. Eu ia quando era mais jovem e brincava bastante. Fui muitas vezes, perdi a conta. Mas, na época, ficava ‘na pipoca’, não tinha dinheiro para comprar camarote, não me atrevia a isso. Ficava no meio da muvuca mesmo. O problema é que sempre tem briga, confusão. Vai muita gente para o Galo, gente de todo tipo, quem quer brincar, e quem quer fazer maldade. Quando conheci meu marido, comecei a frequentar um bar de onde víamos toda a festa. E era muito bom. Fomos alguns anos juntos. Até que, no último Carnaval antes da pandemia, em 2020, fomos para um camarote. Me apaixonei. Nunca vi coisa tão linda na minha vida. A entrada e a saída foram tranquilas. A visão para os trios e os artistas… Tudo maravilhoso. Até meu marido, que não gosta muito de Carnaval, adorou. Todo ano, agora, queremos ir para o camarote. É inesquecível, surreal, completamente diferente do que vivi no passado. Nos últimos dois anos fiquei sonhando voltar”, conta Claudete.
Segundo a organização, o Galo da Madrugada 2023 gerará 4.000 trabalhos diretos neste sábado, entre artistas, apoio, cenografia, produção, entre outros setores. A geração de renda indireta é estimada para cerca de 20 mil pessoas trabalhadores, incluindo 400 catadores de resíduos previamente posicionados ao longo do percurso do bloco. O bloco ainda fará uma versão extra no circuito do Ibirapuera (Obelisco), na cidade de São Paulo, na terça-feira, 21, onde espera reunir 500 mil pessoas. A agremiação levará do Recife cerca de 70 pessoas, entre elas o porta-estandarte, Fernando Zacarias, e o cantor oficial do bloco, Gustavo Travassos, além de outros artistas, infraestrutura e apoio. Outros 500 trabalhadores, aproximadamente, da capital paulista, também estarão envolvidos no segundo desfile.
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