PGR pede afastamento de governador do Acre; Gladson Cameli é acusado de causar prejuízo de R$ 11,7 milhões aos cofres públicos

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A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) o afastamento imediato do governador do Acre, Gladson de Lima Cameli (PP). O político foi denunciado, junto com outras 12 pessoas, pelos crimes de organização criminosa, corrupção nas modalidades ativa e passiva, peculato, lavagem de dinheiro e fraude a licitação. 

 

A denúncia está restrita a um dos fatos apurados na Operação Ptolomeu: irregularidades envolvendo a contratação fraudulenta da empresa Murano Construções LTDA, que teria recebido R$ 18 milhões dos cofres públicos para a realização de obras de engenharia viária e de edificação. Além do governador, também foram denunciados a mulher de Cameli, dois irmãos do chefe do Poder Executivo, servidores públicos, empresários e pessoas que teriam atuado como “laranjas” no esquema.

 

O subprocurador-geral da República, Carlos Frederico Santos, foi o responsável pelo pedido de afastamento até o fim da instrução criminal e de condenação de forma proporcional à participação individual no esquema criminoso. Somadas, as penas pelos crimes podem ultrapassar 40 anos de reclusão.

 

Além disso, a PGR pede para que a decisão judicial decrete a perda da função pública de todos os suspeitos, incluindo o governador, além do pagamento de indenização mínima e R$ 11.785.020,31, conforme previsão do Código de Processo Penal. 

 

Com o pedido de afastamento cautelar de todos os acusados, a Procuradoria também quer a proibição de contato entre os denunciados, que não poderão se aproximar da sede do governo estadual. 

 

O MPF ainda pede que seja determinado bloqueio cautelar de bens dos denunciados de forma solidária até o valor de R$ 12 milhões, para assegurar a reparação ao erário em caso de futuras condenações. Os pedidos serão analisados pela relatora do caso no STJ, ministra Nancy Andrighi.

 

Cameli está em Dubai, para a COP 28, em uma comitiva do governo do Acre.

 

A DENÚNCIA

Iniciadas em 2019, as práticas ilícitas descritas na denúncia teriam causado prejuízos de quase R$ 11,7 milhões aos cofres públicos. 

 

De acordo com as investigações, a empresa Murano Construções e empresas subcontratadas – uma das quais tem como sócio Gledson Cameli, irmão do governador – teriam pagado propina ao governador em valores que superam os R$ 6,1 milhões, por meio do pagamento de parcelas de um apartamento em bairro nobre de São Paulo e de um carro de luxo. 

 

Embora a denúncia trate apenas dos crimes praticados no âmbito do contrato firmado pelo governo estadual do Acre com a empresa Murano, há provas de que o esquema se manteve mesmo após o encerramento da contratação. Foram identificados oito contratos com ilegalidades, e a estimativa é que os prejuízos aos cofres públicos alcancem quase R$ 150 milhões.

 

Ao longo de quase 200 páginas, o MPF apresenta provas de que os crimes praticados tiveram como ponto de partida a fraude licitatória. Esta consistiu na adesão da Secretaria de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano do Estado do Acre, comandada à época por Thiago Rodrigues Gonçalves Caetano, a uma ata de registro de preços vencida pela empresa Murano, que tem sede em Brasília (DF) e nunca havia prestado serviços no Acre. No prazo de uma semana a secretaria estadual assinou contrato com a vencedora da licitação efetivada por meio de pregão eletrônico.

 

O objeto da licitação feita pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Goiano (campus Ceres /GO) era a prestação de “serviços comuns de engenharia referentes à manutenção predial”. Já no Acre, a empresa foi responsável pela execução de grandes obras rodoviárias, tarefas executadas, conforme a denúncia, por companhias subcontratadas, uma delas a Rio Negro Construções, que tem como sócio Gledson Cameli.

 

Os investigadores descobriram que, no dia seguinte à contratação, a Murano firmou com a Rio Negro uma Sociedade em Conta de Participação. Para o  subprocurador-geral da República Carlos Federico Santos, o modelo de sociedade foi escolhido por permitir que o sócio – no caso, o irmão do governador, que por lei não pode contratar com o poder público – permanecesse oculto.

 

As informações reunidas ao longo da investigação comprovaram que 64,4% do total pago pelo estado à Murano decorreu da suposta execução de obras viárias, sobretudo manutenção e construção de rodovias e estradas vicinais, serviços diversos do previsto no contrato. 

 

“Aproximadamente dois terços do valor pago correspondem a objeto totalmente estranho ao contratado, em claro desvirtuamento do princípio da isonomia”, pontua um dos trechos da denúncia. Para os investigadores, a burla à licitação está amplamente configurada, uma vez que o objeto real das obras (a construção de rodovias) deveria ter sido tratado em processo licitatório específico.

 

Também chamou a atenção da PGR o fato de a empresa Murano não ter nenhuma estrutura empresarial no Acre. A Controladoria -Geral da União (CGU) indicou ter havido “subcontratação integral do objeto do contrato, o que configura fuga ao procedimento licitatório e fere o princípio da igualdade, bem como afronta o art. 37, XXI, da Constituição Federal”. Além disso, a descoberta de que essa subcontratação se deu em favor de uma empresa do irmão do governador revela, na avaliação dos investigadores, a utilização de expediente ilegal para encobrir o real destinatário dos recursos, o chefe do Executivo, apontado como o líder da organização criminosa.

 

MODUS OPERANDI

A denúncia reproduz análises técnicas segundo as quais teria havido um sobrepreço de R$ 8,8 milhões, além de um superfaturamento de R$ 2,9 milhões nos serviços contratados pelo Estado do Acre com a Murano. Nos dois casos, a CGU confirmou irregularidades como o pagamento por insumos e serviços que não foram efetivamente fornecidos. Isso foi possível, segundo a denúncia, a partir de fraudes nas medições e termos de ateste assinados por servidores que integravam o esquema.

 

A denúncia detalha como essas irregularidades foram efetivadas, bem como aponta os responsáveis pelos atos. Um dos exemplos mencionados foi o registro do aluguel de 900 andaimes e de 6.840 montagens e desmontagens das estruturas a custo de quase R$ 116 mil para pintura do estádio Arena Acre. Contrastando com os registros documentais atestados e que serviram de base para os pagamentos, os registros fotográficos identificaram não mais do que 20 andaimes pelo local, além de constatar que o serviço foi feito por meio da técnica do uso de cordas para manter os trabalhadores suspensos.

 

As provas reunidas na investigação levaram à conclusão de que, do total de recursos retirados dos cofres públicos, apenas 35% foram destinados ao pagamento por serviços prestados pelas empresas subcontratadas. Segundo a denúncia, a maior parte (65%) seria relativa ao superfaturamento e sobrepreço, tendo como destino o repasse ao governador, ao irmão e a outros envolvidos. 

 

Para Carlos Frederico, o peculato está devidamente comprovado, bem como o dolo e a má fé dos acusados. Foi possível comprovar, por exemplo, que as ordens de serviço emitidas no âmbito do contrato eram criadas considerando “o saldo de empenho existente em determinada rubrica orçamentária, e não a real e efetiva necessidade do órgão público contratante”.

 

 A adesão a ata de registro de preço – prática conhecida como “carona” – permite que um órgão da Administração Pública promova uma contratação aproveitando a licitação feita por outra entidade pública. No entanto, a denúncia explicita que o esquema montado pelos investigados permitiu que se efetivasse uma dispensa de licitação para além das hipóteses previstas na Lei de Licitações 8.666/ 93.

 

 “As condutas foram praticadas pelos concorrentes de forma dolosa, com o intuito de obtenção de vantagem indevida em detrimento do erário, desejando-se efetiva lesão ao patrimônio público. Mais além, a conduta implicou o prejuízo por sobrepreço e superfaturamento”, reitera o texto.

 

A petição destaca em diversos trechos que o esquema se manteve com a participação de empresas de fachada, mesmo após o fim do contrato com a Murano. Ao todo, R$ 270 milhões foram pagos pelo Estado, sendo que R$ 150 milhões podem ter sido desviados. Para o MPF, trata-se, portanto, de uma sofisticada organização criminosa, entranhada na cúpula do Poder Executivo acreano. “Os integrantes do grupo, além de se locupletarem, trouxeram sensível prejuízo à população acreana, que deixou de ter os serviços públicos regularmente custeados pelas verbas desviadas em prol dos interesses egoísticos dos integrantes da ORCRIM”, frisa.

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