O ex-presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), Alessandro Stefanutto, tentou obter informações da Polícia Federal (PF) sobre investigações envolvendo descontos irregulares em benefícios previdenciários, meses antes de ser afastado do cargo. O pedido foi feito em outubro de 2024, mas a resposta da PF, negativa, só chegou cerca de cinco meses depois, e às vésperas da operação que resultaria em sua demissão.
O documento, ao qual a Folha de S.Paulo teve acesso, revela que Stefanutto solicitou formalmente, em 7 de outubro de 2024, ao diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, dados sobre investigações relacionadas a reportagens veiculadas pelo portal Metrópoles em julho daquele ano. As matérias expunham um suposto esquema de fraudes envolvendo a Associação dos Aposentados Mutualistas para Benefícios Coletivos (Ambec), alvo de operação do Ministério Público de São Paulo e da Polícia Civil estadual.
No ofício, Stefanutto afirmou que o INSS precisava das informações para fundamentar medidas administrativas contra possíveis irregularidades, ressaltando que as suspeitas não envolviam diretamente o instituto, mas afetavam sua imagem pública. O então presidente pediu acesso a dados da operação e a qualquer informação que auxiliasse o órgão a adotar providências dentro de sua competência, ainda que respeitando o sigilo das investigações.
A resposta da PF, enviada apenas em março de 2025, negou o compartilhamento das informações, sob o argumento de que as investigações mencionadas não estavam sob sua condução, mas sob responsabilidade de órgãos estaduais. A corporação acrescentou ainda que, caso houvesse apurações internas sobre o tema, elas estariam sob sigilo e, portanto, não poderiam ser compartilhadas.
O documento circulou internamente no INSS na quarta-feira (23), dia em que a Polícia Federal, junto à Controladoria-Geral da União (CGU), deflagrou a Operação Sem Desconto, que levou ao afastamento de Stefanutto e de outros dirigentes da autarquia. Eles são suspeitos de omissão diante de um esquema de descontos indevidos em aposentadorias e pensões, que teria movimentado até R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
Nos bastidores, dirigentes afastados alegam que o ofício de Stefanutto enfraquece as acusações de inação, já que demonstra iniciativa da presidência do INSS em buscar cooperação institucional para enfrentar as irregularidades. Por outro lado, integrantes da PF argumentam que não seria possível fornecer informações sobre investigações que envolvessem o próprio presidente do INSS.
Durante coletiva à imprensa no mesmo dia da operação, o diretor-geral da PF evitou entrar em detalhes sobre os motivos do afastamento da cúpula do instituto. Ele afirmou, no entanto, que a medida foi baseada em evidências colhidas a partir de um inquérito iniciado em junho de 2024.
A ofensiva das autoridades ocorre após uma série de alertas ignorados. O Tribunal de Contas da União (TCU) realizou uma auditoria em junho de 2024, que detectou irregularidades em R$ 91 bilhões em descontos consignados na folha de pagamento do INSS. A Controladoria-Geral da União também identificou falhas graves em 29 entidades associativas, das quais 72% não apresentaram documentação completa ao INSS. Onze delas foram alvo de ações judiciais e tiveram os repasses suspensos.
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