Multidão acompanha o Círio de Nazaré, em Belém do Pará

Publicado:

Gustavo Werneck
 
 
Belém (PA) ??? Maria, Nazaré, Belém, procissão, fé e uma multidão que percorre as ruas, cruza os rios e atravessa as estradas mostrando, em silêncio e som, a força das palavras e da sua crença. Ontem , em Belém (PA), mais de 2 milhões de pessoas participaram das festividades do Círio de Nazaré, cujo ponto alto está no tradicional cortejo com a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, padroeira do Pará e Rainha da Amazônia. 
 
Após dois anos de interrupção devido à pandemia, a celebração de 2022 com o tema ???Maria mãe e mestra??? retornou às vias públicas da capital paraense arrebanhando moradores de todo o Norte do país e de outros estados. 
 
Impossível não se emocionar ao ver passar a procissão ao longo de 3,6 quilômetros, durante seis horas ??? o início foi às 7h20, com a saída da Catedral da Sé, no Centro de Belém. E emoção pode ser uma palavra mínima para homens e mulheres que seguram a corda em torno da padroeira. O gesto pode expressar gratidão ou pedido de graças, busca de cura para o corpo e para a alma, coração aberto para a esperança e pedido de bênçãos particulares ou coletivas.
 
 
B??N????OS São muitas as cenas de demonstração de fé nas ruas de Belém. Pessoas pagando promessas e se movimentando de joelhos no asfalto, com amigos e parentes estendendo papelão para não causar muitas lesões; grupos carregando rosários gigantescos; pais e filhos descalços, seguindo a procissão; e crianças vestidas de anjo, enquanto os pais levam velas gigantescas. Momentos tão fortes que comovem e ficam na memória de quem vê ou vive a experiência.
“Agradeço pela saúde da minha mãe”, disse um homem, com as mãos e pés enfaixados, seguindo a procissão de joelhos.
 
Com os livros sobre a cabeça, Rosilda Gomes Vilhena, de 52 anos, casada, agradeceu por ter passado no vestibular de serviço social na Universidade Federal do Pará. “Estou há 26 anos sem estudar, e agora muito feliz por ter retornado à sala de aula. Sou a primeira da minha comunidade quilombola a ingressar nesse curso”,  disse Rosilda, que tem três filhas, uma delas adotada.
 
Carregando uma cruz da qual nem quis saber o peso, o professor e estudante de medicina Bruno Teixeira, de 31 anos, seguiu a procissão movido pela força da fé e pelo estímulo do agradecimento. “Perdi dois amigos para a COVID-19, mas outras pessoas queridas se salvaram. Minha mãe está bem, consegui resolver questões pessoais, pela intercessão de Nossa Senhora de Nazaré”, afirmou Bruno.
 
Ao lado do marido, da filha e da neta, Maria do Socorro Garcia pediu a intercessão de Nossa Senhora de Nazaré para reforma da casa, que estava com o telhado danificado pelas chuvas. “Finalmente conseguimos, depois de mais de 10 anos de luta. Nossa Senhora nos socorreu”, contou a mulher com alegria e carregando uma casinha feita de isopor reconstituindo a parte recuperada.
 
A bailarina Isabelle Maria Garcia da Silva, de 17, seguiu a procissão fazendo o que mais gosta: dançando, de sapatilha. Entre pontas e pliés, contou que conseguiu ingressar na Escola de Teatro e Dança da Universidade Federal do Pará. “?? um vestibular muito concorrido, então pedi ajuda a Nossa Senhora de Nazaré e ela atendeu”, revelou a jovem.
 
Ajudado por um amigo, Ruberval Farias, de 59, levou um barco pelas graças alcançadas. “Tive sérios problemas de saúde e me salvei. Todo ano, trago uma embarcação em sinal de agradecimento.”
DEVO????O Mineiro de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte e há 12 anos no Pará, o arcebispo metropolitano de Belém, dom Alberto Taveira, conta que o Círio começou a partir da experiência do caboclo Plácido, que levou para casa uma imagem encontrada à margem de um Igarapé. ???Só depois, a partir da casa, surgiu uma capela, depois uma igreja, paróquia, basílica e santuário. Mas tudo começou pequeno, na dimensão da família.??? 
 
Dom Alberto Taveira explica que a primeira lição do Círio está na presença de Maria nas casas. ???A presença das imagens de Nossa Senhora de Nazaré em todas as famílias pode ser símbolo do acolhimento oferecido à Virgem Maria, transformando nossas casas em Casas de Maria???. Na multidão, ele disse ficar impressionado ???com os olhares das pessoas??? e também com os promesseiros ???que se multiplicam por milhões, escondendo e revelando o mistério humano, envolvendo a todos, sem exceção???.
 
A Arquidiocese de Belém acredita que, no reencontro com os devotos, o Círio tenha reunido público superior a 2 milhões de pessoas, que foi a marca em 2019. O número deverá ser divulgado nos próximos dias pelas autoridades.
BEM CULTURAL Maior concentração católica no mundo, considerando-se a procissão de um dia, o Círio de Nazaré, realizado há mais de 200 anos, se traduz por uma monumental manifestação de fé à Nossa Senhora de Nazaré, no segundo domingo de outubro. A grandiosidade mereceu alguns títulos que enchem de orgulho os paraenses. Em 2013, a celebração foi reconhecida como Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade, pela Unesco e também como Patrimônio Cultural do Brasil, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
 
No sábado (8/10) houve a romaria fluvial, com saída do  distrito de Icoaraci, numa distância correspondente a 18,5 quilômetros e duração de duas horas. Os barcos estavam enfeitados e foram aplaudidos pela população e visitantes. “O Círio tem uma força cultural muito intensa, até ultrapassa as fronteiras da religião”, disse o psicólogo e sexólogo Robson Morrison ao lado da mulher, Silvia Mosquim, que trabalha na área de RH. Morador do Bairro Carmo, na Região Centro-Sul de Belo Horizonte, o casal mineiro se disse apaixonado pela Região Norte do Brasil. “?? nossa primeira vez no Círio. Impressiona a mobilização de todos, independentemente da crença, para fazer esta festa”, afirmou Robson.
 
Participando pela segunda vez, o padre Wellington Eládio, mineiro de Caeté, na Grande BH, destacou que, nesses dias, Belém se torna a capital mundial mariana da fé. “?? muito bom estar de volta ao Círio de Nazaré. Eu me emociono com tudo que vejo e vivo. Trata-se de uma experiência que não pode ser descrita, mas somente vivida.”
O repórter viajou a convite do 
Instituto Cultural Vale.  
 
SAIBA MAIS
 
Mãos de esperança seguram a corda
A corda que acompanha o cortejo do Círio e cerca a berlinda, o andor fechado onde vai a imagem de Nossa Senhora de Nazaré, passou a fazer parte do Círio em 1885, quando uma enchente atingiu a orla, em Belém, no momento da procissão. Com a força das águas, a berlinda ficou atolada e os cavalos não conseguiram puxá-la. Os animais, então, foram desatrelados e um comerciante emprestou uma corda para que os fiéis puxassem a berlinda. A partir daí, a corda passou a fazer parte do cortejo, tornando-se um ícone usado na Trasladação e no Círio.
Confeccionada em sisal torcido, a corda tem 400 metros de comprimento (para cada uma das romarias) e duas polegadas de diâmetro. Até 2003, o formato da corda era de ???U??? com as duas extremidades atreladas à berlinda. A partir de 2004, por motivos de segurança, a corda ganhou formato linear dividida em cinco estações confeccionadas em duralumínio que ajudam a dar tração à corda e ritmo às romarias. 

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