A riqueza das nações não é proporcional à soma dos valores de suas matérias primas. Se assim fosse, a Rússia seria o país mais rico do mundo porque possui enormes reservas de petróleo, gás, minérios de todos os tipos. O mesmo critério se aplica a Argentina que possui reservas minerais de alto valor, terras planas, gado de ótima qualidade e população alfabetizada. No entanto, a Rússia tem um produto interno bruto inferior ao do Brasil e a Argentina encontra-se na beira do precipício financeiro.
Em sentido inverso, o Japão não possui praticamente nada em matérias de recursos minerais. Sua agricultura é caríssima, subsidiada, o território é agredido por terremotos frequentes, mas o país é a quarta maior economia do mundo. Outro exemplo gritante e distante é de Cingapura, país que encontrou sua independência nos anos setenta quando era um porto abandonado e hoje se transformou numa encruzilhada de grandes negócios. Seu território, uma ilha, abrange 580 quilômetros quadrados quando a maré está baixa. Possui uma das mais elevadas rendas per capita do mundo.
O que muda na análise da situação política e financeira de qualquer país é seu sistema de governo. Na África há diversos países riquíssimos em matérias primas que não conseguem vencer o subdesenvolvimento. Em O Sonho do Celta, magnífico texto de Mário Vargas Llosa (Alfaguara), ele descreve os horrores que os belgas promoveram no Congo, um território que foi doado ao Rei Leopoldo – o país era dele – que criou uma empresa para educar, levar a mensagem evangélica e civilizar os selvagens. O que ocorreu foi a escravização da população negra que passou a trabalhar submetida à tortura, espancamentos e assassinatos. O país riquíssimo continua subdesenvolvido, agora sob o guante de um ditador.
O autor descreve também a situação extrema vivida na região de Putumayo, na Amazônia peruana. Lá os índios foram escravizados por empresa inglesa para colher o látex, matéria prima da borracha. Tinham metas a cumprir e, como no Congo, quando não as alcançavam sofriam bárbaras torturas e até amputações. Estes países ricos continuam pobres. A colonização promovida pelos europeus nas Américas e na África explicam alguns graus de atraso e dependência econômica no Ocidente. A maioria das sociedades no novo mundo não conseguiu ultrapassar as amarras do colonialismo. Os únicos que superaram o colonizador foram as treze colônias reunidas nos Estados Unidos.
A revolução americana passa pela constituição de 1787. Foi um trabalho duro com muita discussão. Todos os delegados, pingando de suor, participaram da assembleia na Filadelfia durante o verão inteiro em sigilo. As janelas do salão onde ocorreram as reuniões foram lacradas com tábuas para evitar que as conversas saíssem daquele recinto. Em meados de setembro eles alcançaram o texto redigido em quatro folhas de pergaminho. No dia 30 de outubro de 1787 o jornal New York Packet publicou na primeira página, junto com a previsão do tempo, a Constituição dos Estados Unidos, com 4.400 palavras. Na mesma edição havia o seguinte anúncio: Vendo jovem criada negra, 20 anos de idade. Saudável, mas teve varíola. Tem um bebê do sexo masculino. A contradição esteve presente desde o primeiro ato.
O sistema político presidencialista envolveu as três Américas. Sem muito sucesso. As ditaduras se multiplicaram e as riquezas foram canalizadas para o benefício de poucos e a pobreza de muitos. A Venezuela é um bom exemplo. O petróleo da província de Maracaibo atraiu empresas norte-americanas. Os lucros foram para a elite e o povo foi colocado à margem. Há diversos exemplos sul-americanos. Mas o Brasil, ao contrário, jamais desfrutou de riquezas ao longo de sua história. O ouro das minas gerais foi levado para Portugal e Inglaterra. Restou pouco para a novíssima nação independente.
Em tempos recentes, o pré-sal abriu novas perspectivas para a economia brasileira. Parte deste dinheiro foi utilizado para financiar o desenvolvimento, de maneira algo desastrada, na administração Dilma. Agora, surge um novo pré-sal, na chamada Margem Equatorial, é a chance de investir na prospecção do petróleo e com estes recursos financiar a transição energética. Além de levar progresso e desenvolvimento ao norte do Brasil, que desde a Independência é uma região esquecida pelo poder central.
É claro que há de haver segurança na extração do óleo, a mesma segurança que os norte-americanos utilizam no Alaska, os russos na Sibéria, os noruegueses no Mar do Norte e os angolanos em Cabinda. É a forma de fazer com que os recursos naturais, de grande valor, ajudem o país a superar o subdesenvolvimento de maneira independente e autônoma. E equilibrar as demandas de preservar o meio ambiente com a possibilidade efetiva de produzir desenvolvimento na imensa região que foi relegada à sua própria sorte.
Feliz ano novo.
André Gustavo Stumpf, jornalista ([email protected])
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