Polícia de SP apura atuação de servidores em enterro de falso médico

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Dois funcionários da Prefeitura de Guarulhos, na Grande São Paulo, estão sendo investigados pelo Ministério Público de Sorocaba. Eles são suspeitos de liberar irregularmente o corpo de um indigente, utilizado na farsa do enterro do falso médico Fernando Henrique Guerrero. Acusado de homicídio e exercício ilegal da medicina, Guerrero tentou forjar a própria morte para escapar da Justiça.

Segundo documentos do processo, que foram obtidos pelo Metrópoles, o corpo seria retirado de uma unidade de saúde municipal, com a ajuda de funcionários do serviço funerário. É alegado que esses servidores receberam dinheiro para facilitar a fraude. A Polícia Civil descobriu que Fernando Henrique se passou por morto para não ser preso.

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As investigações revelam que entre os dias 6 e 10 de janeiro de 2025, o sistema da Secretaria de Saúde de Guarulhos registrou a entrada e posterior exclusão de um cadáver masculino não identificado. Essa data coincide com o falso falecimento de Fernando Henrique, conforme a certidão de óbito apresentada por sua defesa, que alegava múltiplas falências orgânicas como causa da morte.

O promotor Marcos Fábio de Campos Pinheiro apontou que existem indícios fortes de que o corpo utilizado no enterro foi desviado de uma unidade pública, com participação de servidores municipais. Ele também observou que a exclusão do registro e o uso do corpo indicam um conluio entre agentes públicos e o réu.

O falso hospital e o velório inexistente

A certidão de óbito mencionava o Hospital Brás Cubas como local de falecimento, porém, esse endereço se refere à residência do falso médico e não a um hospital registrado. O Tribunal de Justiça de São Paulo confirmou que o documento não tinha origem em um cartório habilitado.

O enterro, segundo o processo, deveria ter ocorrido no cemitério Necrópole do Campo Santo em 10 de janeiro de 2025. Entretanto, a Promotoria verificou que nenhum sepultamento foi registrado nesse dia.

Servidores sob investigação

Os dois servidores, cujos nomes são mantidos em sigilo, estão sendo investigados por terem intermediado a liberação do corpo sem identidade, sob custódia do Serviço Funerário Municipal. Em depoimento, um dos funcionários alegou ter recebido ordens para liberar o corpo, alegando que era para uso didático.

Outro servidor, também em depoimento, negou envolvimento, mas notou uma movimentação estranha. Ele mencionou que houve a retirada do corpo à noite, sem registro formal. Quando questionou, foi informado que se tratava de um caso sigiloso.

O Ministério Público está apurando se houve pagamento de valores entre R$ 3 mil e R$ 8 mil para o desvio do corpo. O Instituto Médico Legal de Guarulhos foi acionado, mas não encontrou registros que correspondessem às remoções de cadáveres nesse período, fortalecendo a hipótese de um desvio interno.

Descobrindo a fraude

A farsa veio à tona quando o Ministério Público recebeu uma comunicação da 2ª Vara Cível de Guarulhos, informando que o suposto falecido havia assinado um documento de paternidade dois meses após a sua morte. Como resultado, o juiz revogou o reconhecimento de óbito e restabeleceu o mandado de prisão de Guerrero.

O promotor comentou que a falsificação da certidão de óbito e a manipulação do cadáver revelam um método sofisticado de fraude processual e corrupção administrativa, que ultrapassa o interesse individual de Guerrero.

A investigação foi encaminhada ao Gaeco, que instaurou procedimento para apurar falsidade ideológica, corrupção passiva e vilipêndio de cadáver.

Morte em Sorocaba

Fernando Henrique Guerrero é acusado de homicídio de Therezinha Monticelli Calvim, de 67 anos, em setembro de 2012, na Santa Casa de Sorocaba. Ele se apresentava como médico, mesmo sem ter formação ou registro na área da saúde.

Testemunhas afirmaram que Guerrero atendeu pacientes e prescreveu medicamentos, e uma enfermeira relatou que só descobriram a verdade após a morte de uma paciente.

Posicionamento da prefeitura

A Prefeitura de Guarulhos informou que instaurou uma sindicância interna para investigar a conduta dos servidores. Os dois profissionais foram afastados de suas funções e a sindicância, iniciada em agosto de 2025, ocorre paralelamente à investigação do Gaeco.

Como deveria funcionar o processo

  • Identificação e guarda: Corpos sem identificação são recolhidos pelo IML, onde são submetidos a necropsia e coleta de impressões digitais. O IML informa a prefeitura, que deve manter o corpo por até 15 dias aguardando reconhecimento familial.
  • Autorização para sepultamento: Após esse prazo, o corpo é encaminhado ao Serviço Funerário Municipal, mediante autorização formal, com número de registro e local de destino. Esses dados devem ser verificados entre o IML, o serviço funerário e o cartório civil.
  • Sepultamento público: O sepultamento acontece em cemitério municipal, com registro nominal ou de “indigente masculino/feminino”, além de um protocolo e mapa do local.

Falhas no sistema

  • O corpo foi liberado sem protocolo formal e com cadastro posteriormente excluído.
  • O IML não recebeu aviso sobre a destinação do corpo.
  • O cartório recebeu uma certidão com selo digital falsificado.
  • O enterro foi registrado em um cemitério que não existe.
  • A situação resultou na criação de um óbito oficial sem corpo identificado.

Um morto sem nome para um vivo culpado

O Ministério Público considera que este caso reflete a falha do controle público sobre a morte. O promotor destacou que enquanto o verdadeiro morto é apagado dos registros, o criminoso tenta desaparecer para evitar suas responsabilidades. O Estado, nesse cenário, foi cúmplice, por omissão.

Fernando Henrique Guerrero se entregou à polícia em 24 de junho de 2025 e permanece à disposição da Justiça, após ser alvo de um novo mandado de prisão devido à descoberta da fraude. A investigação agora tenta identificar quem era o homem enterrado em seu lugar e quem facilitou seu sepultamento.

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