Centro das discussões sobre a segurança nacional nas últimas semanas, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) tem mais da metade do quadro de servidores desocupado. De acordo com dados do governo federal, 76,2% das vagas na autarquia não estão preenchidas.
Os números são de dezembro de 2022 e foram coletados pelo Metrópoles na página de Dados Abertos do governo federal.
De acordo com os dados, dos 4.572 cargos efetivos aprovados em lei na Abin, 3.484 estão vagos, ou seja, não foram ocupados. Os demais 1.088 estão preenchidos.
Segundo as informações divulgadas pelo governo federal, a maior parte dos cargos vagos (1.419 posições) é para o posto de oficial de inteligência.
Em seguida, estão os cargos de agente de inteligência, com 875 postos vagos, e de oficial técnico de inteligência, com 330 postos sem servidores.
As três tarefas também são, respectivamente, as que têm maior número de vagas aprovadas em lei na Abin. Veja:
A AbinA autarquia é responsável por “fornecer ao presidente e a seus ministros informações e análises estratégicas, oportunas e confiáveis necessárias ao processo de decisão”, conforme consta na página oficial do órgão.
A agência também cuida de análises sobre oportunidades e amaeças relacionadas à “proteção de fronteiras nacionais; segurança de infraestruturas críticas; contraespionagem; terorismo; proliferação de armas de destruição em massa, relações internacionais; segurança das comunicações” e outros temas.
ConcursoO último concurso realizado pela Abin, em 2018, ofertou 300 vagas efetivas na agência: 220 para oficial de inteligência (com salário de R$ 16.620,46); 60 para oficial técnico de inteligência (com salário de R$ 15.312,74); e 20 para agente de inteligência (com salário de R$ 6.302,23).
As 300 vagas foram preenchidas com nomeação oficializada pelo órgão. No entanto, os demais 409 aprovados no certame pedem a convocação para novos postos na Abin, devido à vacância de cargos na agência.
Em setembro de 2021, o Ministério da Economia autorizou a nomeação de 75 excedentes do concurso, o que representa 25% do quadro de vagas abertas pelo certame. Desde julho de 2022, a Comissão de Aprovados no concurso pede a nomeação dos demais 409 excedentes. O grupo chegou a protocolar ofício junto ao Ministério da Economia, mas ainda não teve retorno.
“São quatro anos que a gente está nessa expectativa. Nesse período de 4 anos, além dos 300 que eram obrigados a nomear, nomearam mais 25% das vagas. Sobrarm 409. É totalmente desproporcional, porque a Abin tem quase 80% dos cargos vagos”, defende Everton Aguiar de Oliveira, membro da comissão de aprovados.
RestruturaçãoA convocação dos aprovados também é demanda dos servidores que já integram o quadro de funcionários da Abin.
Em nota divulgada em 8 de janeiro, data dos ataques aos Três Poderes em Brasília, a União dos Profissionais de Inteligência de Estado da Abin (Intelis) rechaçou os atos terroristas e solicitou, entre outras demandas, o reforço do quadro de pessoal do órgão.
“O necessário aprofundamento dos trabalhos de Inteligência em defesa do Estado Democrático de Direito no Brasil depende da urgente reforma das prerrogativas legais da Abin, com definição de meios e focos de atuação; da vinculação da estrutura civil dentro da Presidência da República; do reforço do quadro pessoal; e do efetivo controle externo da atividade exercida pelo Congresso Nacional”, consta na nota.
Leia a íntegra da nota divulgada pela Intelis:
3ddaa338edc05d4c65cf434817443aaa by Rebeca Borges on Scribd
Em nota enviada ao Metrópoles a diretoria executiva da Intelis pontuou que realizar as atividades da agência com um quadro reduzido de servidores é “muito difícil”.
“Com um quinto das vagas preenchidas, concursos a cada 10anos em média e remuneração seriamente defasada em relação às demais carreiras de Estado, que gera uma grande evasão de servidores, é urgente para o interesse nacional, que a Abin procura salvaguardar, buscar solucionar essa questão”, frisou a associação à reportagem.
Além disso, a Intelis avaliou como “essencial e urgente” a desmilitarização dos órgãos de inteligência nacional e a desagregação da Abin do GSI.
“A ideia de que um ministério militar serviria como anteparo ou ‘fusível’ para proteger o presidente de qualquer eventual crise é falaciosa. Nunca funcionou assim, e guarda em si a premissa de que militares seriam mais resilientes e menos suscetíveis politicamente que ministros civis, o que a vida pública brasileira recente revelou não ser necessariamente o caso”, avaliou a associação.
Segurança nacionalEm entrevista ao Metrópoles o professor Thiago Galvão, doutor em relações internacionais pela Universidade de Brasília (UnB), explica que a função da Abin é “transformar informação em inteligência”.
“Recebe-se a informação e, a partir delas, a Abin gera inteligência e direciona aos órgãos brasileiros”, explica. Para o docente, a vacância de cargos demonstra uma desestruturação no órgão.
“É preciso que se tome, muito rapidamente, medidas no sentido de realizar novos concursos e ações de capacitação daquelas pessoas que estão trabalhando no órgão há algum tempo. Você precisa renovar os cargos”, pontua Galvão.
O professor pontua a separação entre Abin e GSI —uma das demandas dos servidores da agência — como possibilidade de dar mais autonomima ao órgão, especialmente diante da tentativa do governo de Lula (PT) de “desmimlitarizar” os órgãos de segurança ligados à presidência da República.
“Depois do episódio do 8 de janeiro, ficou claro que o GSI precisa ser um órgão com uma liderança ou um comando civil, ou híbrido, civil-militar. Um esquema mais híbrido onde se tenha miliares e civis, com autoridade para lidar com as questões da informação, assegurando a segurança da presidencia da República”, opina.
O que diz a Abin?A reportagem do Metrópoles procurou a Abin para saber o andamento do pedido de convocação dos excedentes, protocolado pela Comissão de Aprovados no último concurso.
A agência também foi questionada sobre a eficiência das atribuições da Abin diante da defasagem no quadro de servidores. O órgão não respondeu aos questionamentos da reportagem.

Facebook Comments