Zelensky contra o relógio

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Em um ano com tantos acontecimentos políticos relevantes e a guerra no Oriente Médio se espalhando por outros países, muitos não consideram a guerra ainda em curso na Ucrânia como o principal conflito regional a se observar. De fato, se analisarmos as mudanças territoriais dos últimos seis meses, pouco mudou. Os grandes avanços iniciais por parte dos russos no primeiro semestre de 2022, seguidos pela única contraofensiva ucraniana bem-sucedida na região de Kharkiv e Kherson, estão cronologicamente no tempo das guerras, muito distantes de hoje. Na região de Donetsk os russos avançam em direção a Kramatorsk tomando o controle de pequenos vilarejos, enquanto os ucranianos conseguiram em agosto penetrar o território da Federação Russa operando militarmente diretamente do Oblast de Kursk. Bombardeios na rede elétrica ucraniana continuam acontecendo desde o primeiro inverno do conflito e drones lançados para a Rússia já atingiram Moscou, mas apesar das trágicas mortes de civis, a Guerra da Ucrânia parece ter chegado a um impasse estratégico ou a uma pausa tática perigosa para os próximos meses.

Nos últimos três meses o lado dos ucranianos e dos aliados ocidentais europeus, tinham expectativas para uma ajuda mais robusta e contundente a Volodymyr Zelensky, centradas na eleição de Kamala Harris, já que a manutenção de uma presidente democrata, significaria a continuação da política de Joe Biden para o leste europeu e a OTAN. Do lado russo, esse último trimestre, foi de construção de alianças mais poderosas que superassem a relação de amizade já existente com a Coreia do Norte. Em outubro, a Coreia do Sul, Estados Unidos e a própria Ucrânia confirmaram a presença tropas de norte-coreanas no território russo, próximo à fronteira ucraniana. Em novembro, Donald Trump ganha as eleições presidenciais e como um de seus últimos atos como presidente, Joe Biden, autoriza a utilização de mísseis de longo alcance de fabricação norte-americana contra o território russo pelo exército de Zelensky. 

Hoje a guerra completa 1000 dias de sofrimento e incerteza, passando por inúmeros acontecimentos que chacoalharam a ordem mundial, a estabilidade do governo em Moscou e abriram muitas ramificações para um conflito em escala global em meio a centenas de milhares de mortos. Donald Trump já deixou claro que utilizará a sua influência e amizade com Vladmir Putin, construídas em seu primeiro mandato, para finalizar a guerra o mais rápido possível, em um acordo que militarmente beneficiaria os russos e os entregaria pelo menos 20% do território ucraniano. Em um cenário, no qual em cerca de 60 dias Zelensky sabe que seu principal aliado o abandonará à própria sorte, a utilização dos mísseis de longo alcance se mostra a última cartada possível para ter maior poder de negociação quando Trump sentar-se no Salão Oval. 

Sabendo do poder de destruição de mísseis que conseguem viajar até 320 km desde seu ponto de lançamento, os russos atualizaram sua doutrina nuclear, incluindo agora a utilização de bombas nucleares táticas como uma resposta a um estado não nuclearizado, que seja ajudado com armamentos de estados nuclearizados em um ataque ao seu território. Basicamente, a tradução livre nos faz ler: caso a Ucrânia utilize os mísseis recém autorizados pelos Estados Unidos, a Rússia poderá responder jogando bombas nucleares táticas sob o território ucraniano.

Nesse sentido, muitos analistas especializados na doutrina nuclear soviética e russa ao longo das décadas e o poder da deterrência nuclear para evitar a escalada de conflitos, acreditam que seja pouco provável que ambas as ameaças se concretizem e que tudo tende a ser resolvido a partir de 20 de janeiro de 2025 com um acordo desfavorável à Kiev e ao povo ucraniano. De qualquer maneira, agora todas as cartas estão colocadas sob a mesa, seja por Biden, Trump e a OTAN, seja por Putin e Kim Jong Un. A possibilidade da finalização da guerra com as linhas atuais é a mais cotada a acontecer, enquanto uma escalada em um espiral do caos atômico ainda é uma hipótese extremamente remota, mas cada vez mais formalizada em ameaças mais detalhadas. O cronômetro regressivo marca agora 61 dias e Volodymyr Zelensky corre contra o relógio.

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